Em dezembro, os cristãos se preparam para o nascimento simbólico do menino Jesus, olhando para dentro de si na tentativa de começar um ciclo de mais amor, resiliência e coragem. Estar perto da família, saborear um prato especial e festejar é imprescindível para muitas dessas pessoas nessa época, mas com o grande número de pessoas passando fome, por mais que haja esse sentimento, a ausência do básico por vezes impossibilita esse momento de união e partilha. Embalados pelo espírito natalino, diversos projetos sociais de Juiz de Fora vêm trabalhando para ajudar outras famílias a celebrarem o Natal.
O instituto Florescer, que assiste várias famílias ao longo do ano arrecadando alimentos, prepara cestas natalinas, além de doarem brinquedos e roupas. A diretora do projeto, Larissa Loures, conta que o principal sentimento que a motiva a correr atrás de doadores e formar as cestas é a esperança. “Ao deixarmos as cestas de natal ou os brinquedos para as crianças, a alegria, o sorriso em ver cada um, é o nosso combustível para que possamos fazer muito mais, ir além das nossas limitações.”
Troca de presentes
Além dos tradicionais pratos natalinos, a festa também é marcada pela troca de presentes. A tradição vem dos três reis magos, Belchior, Baltazar e Gaspar, que, segundo o relato bíblico, presentearam Jesus com ouro, mirra e incenso. Mas se para comer um prato gostoso já está difícil para famílias em situação de vulnerabilidade social, receber presentes, então, se configura como um luxo quase impossível. Ou pelo menos é o que a juventude do Instituto Amargen pensava, pois a equipe que faz o projeto acontecer pediu que todos os matriculados de 4 a 13 anos escrevessem cartas para ganhar presentes. Ao todo, são 117 cartinhas remetidas.
O instituto, localizado no Bairro Dom Bosco, além desse projeto de Natal solidário, desenvolve no decorrer do ano diversas oficinas, entre elas de esporte, cultura e educação para crianças entre 6 e 17 anos. Ainda como um ato do projeto está o recolhimento mensal de alimentos básicos a serem distribuídos. Ao todo, são 180 jovens matriculados.
Lara Cardoso, que faz parte da equipe de marketing do projeto, afirma que sempre esteve envolvida com causas sociais. Estagiar no instituto é dar andamento ao que ela sempre gostou de realizar. “Desempenhar essa função na época do Natal é tão importante quanto no restante do ano em que lutamos muito para alcançar parceiros e suporte, mas é ainda mais mágico, principalmente por ser um mês de muita expectativa para as crianças, então trabalhamos para que seja muito especial.”
Entre os matriculados que escreveram a cartinha está a Maria, 9, que pediu de Natal uma roupa, uma maquiagem e um tênis. “Eu amo o Instituto Amargen, porque aqui eu criei amigos, confiança e pessoas que eu posso levar para o resto da minha vida”, diz, expressandoa inda outro desejo: “Que todos tenham um feliz Natal e as famílias se unam, porque é isso o Natal: deixar a família unida e o coração quentinho”.
Mamãe Noel há mais de 40 anos
Outro projeto de Natal solidário voltado para presentear a garotada é desenvolvido pela Mamãe Noel Margarida Maria Gomes, 66, que compra presentes para crianças da Zona Norte de Juiz de Fora há mais de 40 anos. Tudo começou com uma brincadeira, quando seu filho pediu para ver o Papai Noel. Ela se fantasiou sem que o filho percebesse e entregou um presente para ele.
No ano seguinte, Margarida se programou para, além de presenteá-lo, entregar presentes para mais outras 50 crianças. Atualmente, segundo ela, já são mais de 1.500 crianças contempladas com brinquedos, lanches, doces e refrigerante. O trajeto cumprido pela Mamãe Noel inicialmente era no Bairro Esplanada, depois passou para o Jardim Natal, Milho Branco, Amazonas, Monte Castelo e agora os presentes chegam até a algumas localidades da Zonas Rural.
Apesar do projeto ter crescido com o passar dos anos, Margarida afirma que vem enfrentando dificuldades, pois precisou passar por uma cirurgia no coração que a deixou com uma sequela. Com a mobilidade comprometida, ela irá realizar as doações no próprio Bairro Jardim Natal. “Fiquei com um problema nas pernas, não tenho mais força e não consigo vender lanche e caneta para ajudar nessa festa, apesar de já ter conseguido o salão da igreja, onde vai acontecer o evento neste ano.”
Anjos da Rua e o Natal Invisível
Na tentativa de unir alimentos e presentes, o projeto Anjos da Rua desenvolve o Natal Invisível, voltado para as pessoas “invisíveis” de Juiz de Fora, ou seja, aquelas em situação de rua ou em grande grau de vulnerabilidade. A diretora do instituto, Lúcia Moreira, conta que a primeira etapa do projeto é identificar esses indivíduos.
“A gente vai até a pessoa em situação de rua ou família carente e faz perguntas para entender o que eles fazem e, assim, descobrir o que eles desejam para o Natal. Em seguida, pedimos aos seguidores no Instagram (@anjosdaruajf) ajuda para comprarmos esse presente.” A fim de encontrar essas pessoas, nos primeiros dias de dezembro, os voluntários foram para a rua nessa busca para conseguir atender o máximo de pessoas. “No final, vamos preparar um café e entregar os presentes para eles”, esclarece a diretora.
Além da iniciativa de descobrir quais presentes as pessoas invisíveis desejam, os Anjos da Rua estão preparando cem cestas de natal para os assistidos. Entre os contemplados está Alessandra Balbino, 38. “Espero que neste Natal Deus abençoe os meus filhos e me ajude para que, assim como todos os finais de ano, eu ganhe a minha cestinha básica”, ela torce ansiosa. Ainda como meta para dezembro, o projeto deseja atender 200 crianças com presentes e roupas, além de 400 moradores em situação de rua.
‘Dignidade’
Na última terça-feira (6), a equipe do projeto percorreu algumas vias de Juiz de Fora para conhecer as demandas das pessoas invisíveis. Um dos lugares por onde eles passaram foi a Avenida Brasil, onde encontraram um grupo de moradores em situação de rua. Entre eles, Alberto, 42, que perdeu o contato com a família e já há dois anos vive nas ruas da cidade de Juiz de Fora, recolhendo reciclagem para conseguir sobreviver.
“Já faz tanto tempo que eu não vejo a minha mãe e a minha irmã que eu nem sei como elas são”, afirma. Ele pediu um celular de presente para, segundo ele, conseguir, quem sabe, reencontrar sua família. Francielly Berno, 20, voluntária dos Anjos da Rua que estava realizando a entrevista, disse que, apesar de ser um presente caro, eles vão tentar conseguir comprar. Outro morador em situação de rua abordado foi Jesse, 52, que tinha, quando jovem, o sonho de ser cantor. Ao ser perguntado o que deseja de presente de Natal, falou que busca por dignidade, algo que voluntários como os Anjos da Rua tentam entregar com suas ações no decorrer do ano.