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Medo acompanha caminhoneiros nas estradas

(Foto: Fernando Priamo)

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Diante do medo frequente, caminhoneiros têm evitado circular durante a noite (Foto: Fernando Primo)

Motoristas de empresas do ramo de transporte de cargas vivem o drama de enfrentar o medo de roubos diariamente nas estradas. De janeiro até agora, foram cerca de 30 casos na rota em direção à capital fluminense, segundo estimativa do Sindicato das Empresas de Transporte de Cargas de Juiz de Fora e Região. Diante da situação, condutores já estão se negando a fazer o transporte até o Rio. No último episódio violento na BR-040 envolvendo caminhões da região, um caminhoneiro de 36 anos de uma cooperativa de Visconde do Rio Branco foi rendido. O caso aconteceu na noite do último domingo (6), quando ele prestava serviço para o frigorífico Pif Paf. O trabalhador ficou cerca de duas horas em poder de um criminoso armado. Na perseguição, houve troca de tiros entre o suspeito e os policiais. O bandido acabou se entregando, e o caminhoneiro foi liberado ileso. Por nota, a Pif Paf se mostrou preocupada com a situação e informou que “o episódio alerta, mais uma vez, para a grande incidência de casos de roubo de carga, fato que, infelizmente, se tornou rotina no país”.

O quadro é tão complexo que seguradoras de carga, além de aumentarem os valores cobrados, já se recusam a fazer o seguro de mercadorias que seguem para algumas rotas, o que aumenta os prejuízos do setor. Outro caminho onde as cargas têm sido alvos fáceis de ações criminosas é o de Juiz de Fora a Belo Horizonte. As firmas estão investindo em segurança e mudando processos operacionais para tentar minimizar os riscos, mas apontam que nada tem sido suficiente para barrar a ação de bandidos.

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De acordo com o gerente do Sindicato das Empresas de Transporte de Cargas de Juiz de Fora e Região, Osvaldo José da Silva Filho, a entidade representa hoje 37 empresas de Juiz de Fora e região. Os alvos preferidos dos bandidos são as cargas fracionadas, ou seja, aquelas que reúnem diversos produtos de remetentes distintos no mesmo veículo. Geralmente são caminhões que prestam serviços para os Correios ou e-commerce.

Segundo ele, a situação de insegurança no setor se agravou desde o início do ano passado. Só na rota para o Rio de Janeiro, o aumento nos episódios violentos foi de cerca de 50%. Os casos se elevam ainda mais em épocas de datas especiais, como dia das mães e Natal, quando há mais transporte de cargas de valores visadas pelos bandos. Dados do Instituto de Segurança Pública do Rio de Janeiro apontam que os assaltos a caminhões triplicaram de 2000 a 2016 no estado. Em 2017, a média é de 24 caminhões assaltados por dia.

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Carência de policiais

De acordo com a Polícia Rodoviária Federal (PRF), no trecho da Delegacia de Juiz de Fora, os casos de furtos e roubos ocorrem algumas vezes. O chefe do Núcleo de Policiamento e Fiscalização da PRF em Juiz de Fora, Leonardo Facio, afirma que “a corporação realiza rondas preventivas e atua em locais identificados como de maior probabilidade de ocorrência, visando a inibir a prática criminosa e prender autores”. A situação na região é considerada complexa por ligar duas das principais capitais brasileiras, “não se podendo classificar como um trecho crítico, apesar de merecer a atenção da PRF, que eventualmente realiza operações específicas na região”. Por meio de nota, a corporação afirma, ainda, que existe déficit de pessoal: “A carência de efetivo, considerado abaixo do ideal, e o recente contingenciamento de orçamento do Governo federal, que impôs restrição de circulação de viaturas apenas para atendimentos de urgências e emergências trazem preocupação à unidade, uma vez que o trabalho preventivo deixou de ser realizado.”

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Entidade aponta locais mais críticos

O gerente do Sindicato das Empresas de Transporte de Cargas de Juiz de Fora e Região, Osvaldo Filho, afirma que os pontos mais críticos no trajeto entre Juiz de Fora e a capital fluminense são a descida da Serra de Petrópolis e a região de Xerém, no município de Duque de Caxias (RJ). “Nos dois locais, os criminosos conseguem agir com facilidade e escoar as cargas rapidamente. Os ladrões fazem uma pressão psicológica muito grande nos motoristas, que ficam aterrorizados. Geralmente, os casos acontecem no horário de troca dos plantões da Polícia Rodoviária Federal: pela manhã, entre 5h e 8h, e durante a noite”, comentou. O presidente do sindicato ainda acrescenta: “O grande impacto hoje é o próprio custo, que cada dia se eleva mais. Algumas seguradoras já não querem fazer o seguro dependendo da carga, principalmente se a rota passa pelo Rio.”

Segundo Osvaldo, a orientação é que se evite transitar nestes horários e que, quando possível, os caminhões das mesmas empresas circulem em comboios. “Quando os motoristas estão sozinhos, tornam-se alvos fáceis. Foi o caso do motorista de Visconde do Rio Branco”, pontuou. Ele afirmou que, além destes procedimento logísticos, as empresas estão investindo em equipamentos que podem ajudar a evitar os crimes, como a colocação de bloqueadores e rastreadores. No entanto, o problema é que os bandidos conseguem bloquear estes sinais com um aparelho conhecido como “jammer”. “Estamos trabalhando junto com as polícias para descobrir uma forma de evitar isto. Colocamos também localizadores nas cargas, facilitando que sejam encontradas. Contamos também com a fiscalização e o serviço de inteligência das polícias. É um trabalho contínuo para tentar amenizar este problema que vem nos preocupando muito”, afirmou, acrescentando que o sindicato tem um grupo de segurança, que está se expandindo.

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Entre JF e BH

Levantamento do Sindicato das Empresas de Transporte de Cargas de Juiz de Fora e Região aponta alto risco de roubos no trecho entre Juiz de Fora e Belo Horizonte. Segundo o gerente da entidade, os ladrões agem em trechos com redutores de velocidade, quebra-molas e ainda aqueles onde há acesso fácil a estradas vicinais, locais onde fazem o transbordo da carga roubada. Os pontos mais críticos são de Alfredo Vasconcelos até Conselheiro Lafaiete, onde, de acordo com Osvaldo Filho, não tem hora para ocorrer os crimes. Também há um índice alto de casos na descida próximo a Carandaí e em Cristiano Otoni.

Empresários precisam mudar processo operacional

O proprietário da transportadora Camilo dos Santos, Eduardo Benjamin dos Santos, relatou que, nos últimos quatro meses, sua empresa foi alvo de assaltos quatro vezes no Rio de Janeiro. Em junho, uma das carretas foi interceptada, e o motorista liberado horas mais tarde junto com o caminhão, mas sem a carga avaliada em R$ 500 mil. “A situação é gravíssima, temos o reflexo aumento no seguro das cargas. Precisamos mudar todo nosso processo operacional. Hoje nenhum motorista nosso entra ou sai do Rio de Janeiro entre 22h e 6h. Com isso, toda nossa operação é feita durante o dia.”

Segundo Eduardo Santos, além do aumento no seguro das cargas, o prejuízo é na alteração das rotinas. “Temos que alterá-la, sem que o prazo para entrega seja modificado. Antes, viajávamos à noite, descarregávamos durante o dia e fazíamos as entregas. Agora só chegamos no destino de manhã, para então dar início à descarga dos materiais. Só depois começamos as entregas. Isso apertou muito.” Sobre a rotina de medo entre os funcionários, ele disse que “nenhum motorista fica feliz quando tem que viajar para o Rio. Fazemos rodízio entre eles, nenhum recusou a ir por enquanto, mas acredito que não demora a ter este problema”, finalizou.

Proprietário da JM Logística, Marco Scapim, diz estar preocupado com a situação. Apesar de motoristas e caminhões de sua empresa não terem sido alvos recentes de assalto na rota para o Rio de Janeiro, o medo ronda quem precisa fazer o trajeto. “Acredito que nossa empresa só não é alvo na rota para o Rio, pois a maioria de nossas cargas para este destino não é atrativa para os criminosos, já que são cargas fechadas, de papel e aço, por exemplo. Mas trabalhamos também com cargas fracionadas, que são muito visadas. Tentamos não chegar muito cedo e não seguir para o Rio de madrugada, temos ainda vários equipamentos para melhorar a segurança.”

Segundo o empresário, no fim do ano passado, um caminhão da empresa foi confundido por bandidos quando passava pela rodovia Washington Luiz. “Nosso motorista foi rendido próximo à entrada de uma favela. Os bandidos bloquearam o sinal do rastreador e o levaram para a comunidade. Chegando lá, viram que aquela não era a carga que esperavam roubar, que era de cerveja, e liberaram o motorista”, contou. De acordo com ele, há vários casos na empresa de motoristas que se recusam a fazer o transporte para o Rio de Janeiro. “Eles estão apavorados. Há casos de motoristas que já falaram que, se tiverem que viajar para o Rio, pedem demissão, não querem correr o risco. Já para Belo Horizonte, funcionários que estavam na empresa há 15 anos pediram demissão por não quererem correr risco mais. É uma situação que nos preocupa demais”, pontuou.

Neste trecho Juiz de Fora-Belo Horizonte, Scapim contabiliza cerca de 20 roubos apenas este ano. “Colocamos travas nos baús, fazemos rastreamento via satélite em tempo real e monitoramento de risco 24 horas, mesmo assim, os assaltantes conseguem roubar. Escolhem locais específicos, apontam arma para o motorista, quebram a trava, bloqueiam nosso sinal e roubam. Fazemos de tudo para amenizar o problema, mas nunca conseguimos acabar com ele”, disse.
Há ainda registros em outros pontos do estado, como a região do Sul de Minas e Triângulo, onde um caminhão da JM Logística, que prestava serviço para os Correios, foi roubado em Araxá.

Correios

Por nota, a assessoria de comunicação dos Correios informou que os assaltos a caminhões da empresa no Rio de Janeiro cresceram 117% este ano e afirmou que está em andamento a elaboração de um plano logístico de segurança diferenciado para o Estado, de modo a reforçar a integridade física de seus empregados e da carga postal. “O problema do roubo de carga afeta toda a cadeia produtiva do estado e já causa impacto ao cliente final, uma vez que o problema de segurança pública tem dificultado às empresas a entrega dos produtos, dos insumos para a indústria e até mesmo de gêneros alimentícios. Conforme divulgado este ano pela Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan), o prejuízo causado pelo roubo de cargas no Rio de Janeiro já atinge o montante de R$ 2,1 bilhões em seis anos.”

‘Prefiro não trabalhar que perder minha vida’

Um motorista que trabalha como terceirizado de uma empresa que faz a rota entre Juiz de Fora e o Rio de Janeiro afirma que não faz mais este trajeto. “Há cerca de dois meses que, por um triz, não fui pego por bandidos. Eu levava uma carga de roupas e calçados, quando fui abordado perto da chegada de Magé. Três bandidos armados apontaram armas para mim perto de um quebra-molas. Era madrugada, por volta de 3h. Mas, por sorte, uma viatura, não sei de qual polícia, passou na hora. Eles se assustaram e fugiram em um carro. Eu nem parei, fiquei muito assustado. Sei de vários colegas que já foram assaltados e passaram momentos de terror. Prefiro não trabalhar que perder minha vida”, comentou.

 

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