Cerca de 25 trens cortam Juiz de Fora em um intervalo de 24 horas, fechando as passagens de nível por menos de três minutos em cada uma das vezes. Isso significa que a cidade para, em média, por uma hora e 13 minutos a cada dia para a passagem das composições. O número impressiona, mas já foi pior. Em junho de 2013, conforme reportagem da Tribuna, o tráfego era interrompido por cerca de duas horas. O que mudou desde então foi o tempo de fechamento das passagens de nível, amplamente reduzido. No levantamento feito há dois anos, a interrupção durava entre três minutos e meio e quatro minutos. Agora, o trem fecha a passagem entre dois minutos e 53 segundos e dois minutos e 55 segundos. Para chegar a estes números, a reportagem permaneceu na passagem de nível da Rua Benjamin Constant por 11 horas e 15 minutos, ao longo de dois dias. Neste período, 11 trens circularam na linha, todos com 134 vagões e a uma velocidade média de aproximadamente 35 quilômetros por hora.
A MRS, concessionária que explora a linha férrea que passa por Juiz de Fora, conhecida como Linha do Centro, não admite que os trens estejam mais velozes, mas explica que a velocidade máxima permitida para o trecho é de até 60 quilômetros por hora, e este limite se aproxima à medida que ocorrem investimentos para melhorar a segurança na malha ferroviária. Fato é que as cancelas se fecham quando os trens estão cada vez mais próximos, a partir de ajustes feitos gradativamente em cada uma das 80 passagens dentro do perímetro urbano, sendo 52 de pedestres e 28 rodoviários. No caso da Benjamin Constant, isso ocorre cerca de 30 segundos antes de o trem passar. Mesmo assim, as imprudências são muitas.
Carros e motos quase batem nas cancelas quando elas estão se fechando. Entre os pedestres, algumas situações observadas são ainda mais impressionantes. Há pessoas que correm em direção ao trem e escapam de acidentes por poucos segundos.
Conforme levantamento da Tribuna, que leva em consideração o óbito após o fechamento da ocorrência policial, dos 18 atropelamentos fatais ocorridos este ano em todo o município, sete foram na linha férrea, o que representa 38,8% do total. Em todo o ano passado, entre janeiro e agosto, foram três mortes por trens. Já a MRS reconhece 11 atropelamentos por composições dentro da cidade em 2015 e uma batida. No mesmo período, mas no ano passado, foram sete atropelamentos e dois abalroamentos.
Busca por soluções
Embora, atualmente, os reflexos do fechamento da passagem de nível na Rua Benjamin Constant tenham sido minimizados, em outros cruzamentos o problema é grave. Na Avenida dos Andradas e na Rua Mariano Procópio, em bairro homônimo, por exemplo, formam-se extensas retenções durante esta interrupção do fluxo. O mesmo é observado no Bairro Poço Rico, como nas ruas da Bahia e Pinto de Moura, e também na Zona Norte, altura do Bairro Barbosa Lage, nas Avenida JK e Tangencial Três. Isso ocorre, principalmente, nos horários considerados de pico, que coincidem com entrada e saída de estudantes das escolas destas regiões.
As soluções, apontadas por especialistas, passam pela construção de um contorno ferroviário e de um conjunto de obras de redução destas interseções, formado por trincheiras e viadutos. Estas intervenções, anunciadas em 2012, ainda não saíram do papel, embora o viaduto do Tupynambás esteja em fase de licitação. De acordo com a Prefeitura, sete propostas foram apresentadas para a construção do acesso, e elas atualmente estão em fase de análise.
Contorno ferroviário custaria entre R$ 500 milhões e R$ 1 bilhão
A MRS, concessionária que explora a linha férrea que passa por Juiz de Fora, colaborou há alguns anos em um estudo de viabilidade de um contorno ferroviário, conduzido pela Prefeitura. A fim de evitar especulações imobiliárias, a empresa preferiu não divulgar o projeto para a reportagem, mas alguns detalhes foram citados. Conforme o gerente geral de comunicação da empresa, Marcelo Kanhan, a intervenção é considerada de alto custo. Embora o projeto executivo (responsável pelas análises mais aprofundadas e orçamentos) não tenha sido feito, especialistas ouvidos informalmente pela MRS estimam custo final na ordem de R$ 1 bilhão. “Para ter ideia de quanto vale isso, para a empresa manter seus 1.600 quilômetros de área concessionada, com toda a frota, não gastamos ao longo de um ano R$ 700 milhões. E este montante total, que é uma estimativa, seria usado em cerca de 20 ou 25 quilômetros.”
Em nota, a Prefeitura afirma que o investimento seria superior a R$ 500 milhões, o que exige recursos externos. “O projeto é antigo e já foi levado ao Governo federal para captação de recursos, mas até o momento não houve liberação de verba. Em virtude do valor elevado, a administração optou por outras saídas, como a construção de trincheiras e viadutos, com valores de construção reduzidos e, consequentemente, de mais fácil captação de verbas externas.”
É em razão deste elevado custo que a MRS, segundo Marcelo, investe em obras de redução das interferências com veículos e pedestres, além de melhorias na segurança como um todo. Tanto que, conforme ele, está em vigor um convênio de R$ 10 milhões com a Prefeitura, sendo que R$ 2,5 milhões já foram entregues. Segundo Marcelo, esta verba foi utilizada, inclusive, em obras viárias em andamento no município.
De acordo com o coordenador de segurança patrimonial da empresa, Márcio Barizon, além das 14 passarelas em funcionamento no perímetro urbano, foram revitalizadas quatro passagens de nível. “Também investimentos no trabalho de vigilantes em motos, que chamamos de limpa trilhos. Eles atuam, principalmente, na região central da cidade, através de uma ronda constante.”
Para Márcio, Juiz de Fora recebe atenção especial da empresa porque a população é imprudente. “A segurança se faz presente nos 105 municípios que cortamos, mas Juiz de Fora é especial, principalmente por causa dos moradores de rua e usuários de drogas que insistem em trafegar na linha.” Apesar das sete mortes registradas em 2015 (sendo quatro suicídios confirmados), ele garante que a meta da MRS é zerar os acidentes.
Espaço dos trilhos
Para o engenheiro Luiz Antônio Moreira, especialista em planejamento em transporte urbano e engenharia de tráfego, o uso do espaço dos trens como corredor de transporte coletivo seria uma boa saída, caso o contorno um dia seja viabilizado. “A linha corta a cidade toda, das zonas Norte à Sudeste, então é uma área interessante. Também poderia ter VLT (Veículo leve sobre trilhos), mas a primeira opção é economicamente mais viável.” No entanto, ele não vê esta possibilidade como concreta em curto e médio prazo, principalmente em razão do elevado custo e a falta de fontes de recursos disponíveis.
De acordo com a Settra, no caso de retirada da circulação de trens na cidade, precisaria ser discutido com autoridades e a população o que seria feito com o espaço deixado.