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Estudante da UFJF tem perfil fake criado como garoto de programa

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Por Sandra Zanellla e Marcos Araújo
Delegada Carolina Magalhães orienta vítimas a não acabarem com provas (Foto: Marcelo Ribeiro)

“Tudo aconteceu no domingo. Por volta das 19h30, começaram a chegar mensagens de desconhecidos no meu WhatsApp. Um cara me chamou já me perguntando de disponibilidade e pedindo valores”, contou o estudante da UFJF, 21 anos, importunado no último dia 3 por cerca de 25 pessoas, durante cinco horas, depois de ter um perfil fake criado como garoto de programa no aplicativo de relacionamento gay Grindr. O constrangimento sofrido pelo jovem acende mais uma vez o alerta para a fragilidade das vítimas diante das fraudes no ambiente virtual e da aparente dificuldade na identificação dos autores, já que, em Juiz de Fora, não há delegacia especializada para apurar esses delitos ocorridos na internet.

A assessoria da Polícia Civil local, no entanto, informou que as ocorrências são encaminhadas para a área da distrital correspondente. O rapaz registrou boletim na Polícia Militar, mas disse ainda não ter procurado a Polícia Civil. Apesar disso, o caso dele foi direcionado à 4ª Delegacia, responsável pelos crimes ocorridos na Zona Nordeste da cidade. Por meio da assessoria, a delegada regional, Patrícia Ribeiro, disse não haver previsão de criar unidade especial no município, como existe a Delegacia Especializada de Investigações de Crimes Cibernéticos (Deicc), em Belo Horizonte, mas garantiu que a corporação conta com um setor de inteligência que dá suporte a esse tipo de investigação.

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Os falsos perfis ou as informações mentirosas postadas nas redes sociais costumam ganhar rápida repercussão, aumentando o dano causado às vítimas, que podem ver suas imagens rapidamente distorcidas. Até a ficha cair, o universitário ficou encucado com a quantidade de pessoas interessadas em programa sexual que surgiram concomitantemente no seu WhatsApp. “Me chamavam como se eu tivesse acabado de passar meu número. Comecei a questioná-las sobre onde tinham conseguido meu número. A maioria não respondeu. Até que um disse ter visto meu perfil e conversado comigo no aplicativo de encontro para sexo chamado Grindr”, explicou o estudante. “Continuei sem saber, porque eu não tinha conta nesse aplicativo. Até que esse mesmo cara me mandou um print, mostrando que uma pessoa havia criado um perfil com foto minha e estava conversando e mandando meu WhatsApp, marcando encontros.”

Bombardeio

O aluno da UFJF começou a pedir ao mesmo público que o incomodava para denunciar o perfil fake no programa. “As pessoas não me respondiam, mas parece que estavam denunciando, porque teve uma hora que o perfil sumiu.” Cerca de uma hora depois, no entanto, o jovem voltou a ser bombardeado como se oferecesse serviços sexuais. “Começaram a me chamar novamente. Até que o mesmo cara me mandou outro print mostrando um novo perfil, desta vez, sem minha foto, mas com meu número no lugar do nome. Fui bloqueando e pedindo para denunciar o perfil, dizendo novamente que havia sido vítima de fake.”

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O suplício só terminou por volta de meia-noite. “Logo na segunda de manhã fui registrar o boletim de ocorrência no posto da PM. Tenho todos os prints. Mas foi um constrangimento tão grande que não sei se quero mais mexer com isso. Foi muito assustador mesmo, as pessoas me chamando como se eu fosse fazer sexo naquela hora, marcando encontro comigo”, desabafou o estudante, que veio de Sete Lagoas (MG) para Juiz de Fora há cerca de dois anos para fazer faculdade. Apesar de o perfil fake ter sido excluído, ele teme nova investida. “Fiquei à margem de a pessoa fazer isso comigo de novo, porque ela pode criar um perfil novo e divulgar meu número. Estou até com medo de atender telefone.”
A Tribuna tentou contato com o desenvolvedor do aplicativo Grindr para saber os procedimentos adotados para manter a segurança dos usuários, mas não obteve resposta.

Polícia Civil investiga e orienta vítimas de crimes virtuais

O crime virtual que causou constrangimento ao estudante já teve procedimento instaurado como diligência preliminar pela delegada Carolina Magalhães, titular da 4ª Delegacia de Polícia Civil. Ela informou que o jovem deverá ser ouvido para ser esclarecida a correta tipificação penal. A policial lembrou que as vítimas devem denunciar esses crimes e preservar as provas, como os prints de tela e os pedidos de retirada das postagens do ar, a fim de facilitar a investigação.

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A delegada acrescentou que a maioria dos delitos no meio virtual é contra a honra, portanto, depende da queixa-crime, sendo necessária a provocação da autoridade policial. Carolina alertou que nesses casos, muitas vezes tipificados nos crimes comuns, mas praticados pela rede virtual (com ampla repercussão), as pessoas acreditam que estão acobertadas pelo sigilo da internet, “mas tudo o que se faz na rede mundial de computadores deixa um rastro, portanto, é possível chegar à pessoa que fez a divulgação”. Para a policial, prevenção é a palavra de ordem para não ser vítima dos delitos em redes sociais e afins. Ela sugere evitar senhas vulneráveis, superexposição e cuidado para abrir e-mails.

Solução por via judicial

O advogado especialista em Direito de Tecnologia da Informação, Lair de Castro Júnior, chama a atenção para o fato de Juiz de Fora não contar com delegacia de crimes eletrônicos, levando as vítimas a buscarem solução por via judicial. “É preciso tentar, por meio da justiça, que o provedor de tal serviço informe quem seria o responsável pelo cadastro, para que, efetivamente, possa haver a responsabilização do culpado. A vítima deve procurar um advogado que vai pedir na justiça as medidas cabíveis”, ressaltou, lembrando que é importante destacar que a vítima tem direito à reparação tanto na ordem criminal quanto cível. “Normalmente, os provedores não liberam essa informação, apesar de tirarem do ar o perfil denunciado, mas não dão informações de como esse perfil foi feito, e isso só é possível por meio de via judicial”, orienta.

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Lair avalia que casos assim podem estar relacionados à vingança, pois têm o cunho de prejudicar a vítima. “É importante buscar reparação, para que as pessoas responsáveis não se sintam inatingíveis e não pratiquem tal conduta novamente.” Segundo o especialista, essa prática pode ser encarada como violação indevida de dados. “Há desde uma conduta bem simplificada como a de alguém que quis se vingar, pegando uma foto no Facebook, que já é considerado furto de dados pela Lei Carolina Dieckmann, que dispõe sobre crimes eletrônicos, até algo mais sério, como clonagem de aparelho e roubo de perfil, nos quais vão caber outras penalidades”, avalia o advogado.

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