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Professores de Juiz de Fora comentam primeiro dia do Enem

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Cerca de 3,9 milhões de candidatos participaram do primeiro dia de provas do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) no último domingo (3). Desta forma, dos 5,1 milhões de inscritos no exame, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) registrou 23,1% de ausentes, índice menor que da edição de 2018, quando 24,9% dos inscritos em todo o Brasil não compareceram ao primeiro dia da avaliação. Em Minas Gerais, a média de faltantes foi de 23,5%. Professores ouvidos pela Tribuna apontam diferenças no conteúdo e estrutura da avaliação em comparação a edições anteriores nas provas de Linguagens, Códigos e suas Tecnologias, Ciências Humanas e suas Tecnologias, além da redação, que teve como tema “Democratização do acesso ao cinema no Brasil”.

Uma das principais marcas do Enem é a interdisciplinaridade entre as questões, ponto que se manteve nesta edição, de acordo com a professora Cíntia Medeiros, da equipe de Linguagens do Colégio dos Jesuítas. “As disciplinas estão integradas dentro das questões e como é importante que os alunos percebam que uma disciplina interfere no conhecimento da outra, e isso foi mais marcante ainda nessa prova do Enem.” Diferentemente de exames anteriores, as 90 questões da avaliação trouxeram textos menores, o que pode ter favorecido os estudantes em relação ao tempo de prova.

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Entretanto, de acordo com a professora, houve a falta de cartuns e tirinhas, característica que também costuma ser uma marca do Enem. “Acho que o cartum e a tirinha dão uma quebra daquela leitura maçante, então nós sentimos falta.” Além disso, conforme observado pela equipe de Linguagens do Colégio dos Jesuítas, as questões cobraram gêneros textuais variados, como crônicas, contos, hipertexto e campanhas publicitárias. Em relação à literatura, o exame buscou utilizar autores contemporâneos.

A estudante do 3º ano do Ensino Médio do Colégio Equipe, Caroline Dias, está participando do Enem pela primeira vez. Com base em simulados que realizou anteriormente, Caroline afirma que o exame, de maneira geral, foi diferente do que previa. “Eu esperava uma coisa mais técnica, que iriam cobrar mais gramática, mas a prova foi muito objetiva. Não chegou a cobrar esses pontos específicos, e o tema da redação prendeu bastante. [A redação] deu para desenvolver, não é um tema tão complexo, mas era o que eu menos esperava”, afirma a aluna.

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Ciências Humanas

A prova de Ciências Humanas também trouxe mudanças em sua estrutura e no conteúdo cobrado. De acordo com o professor de História e Sociologia do Colégio Equipe, Vinícius Lara, as questões de Sociologia, por exemplo, estavam “diluídas”, sendo que os alunos apresentaram dificuldade em identificar quais perguntas diziam respeito à disciplina. De maneira geral, houve, também, fuga a determinados temas. “Questões ligadas a causas trabalhistas, a movimentos históricos contestadores, como a Revolução Francesa e como a situação do Brasil durante período de 64, não estavam presentes, e nós, de certa maneira, esperávamos que não estivessem.”

Para o professor, mesmo que o conjunto de temas privilegiados fuja da problematização da história brasileira e de outros temas presentes na contemporaneidade, a prova não foi “negativa ou apelativa”. “Ela tem traços que demonstram uma mudança na forma de entender o que é o ensino no Brasil. Não tem como saber ainda quais são os resultados disso, já que foi o primeiro exame e ainda tem mais alguns sob essa gestão, o que vai pedir que os alunos fiquem mais atentos a se ajustar enquanto as mudanças ocorrem.”

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Os reflexos da mudança de Governo federal podem ter influenciado não só no conteúdo, mas na estrutura do exame, tratado como “uma prova de resistência”. “Nós vimos textos menores, mais simples e menos tecnicistas, acho que isso demonstra algumas coisas, como uma mudança no entendimento do que é o Enem dentro de uma reformulação do Inep e, também, que ao longo do ano, a comissão que elaborava a prova foi modificada várias vezes. Isso tende a se externar na própria confecção do caderno de questões, então a minha leitura sobre essa diminuição da densidade dos textos me parece ser, em um primeiro momento, uma questão de ajustes a nova equipe que está a frente do Enem.”

Especialistas avaliam tema da redação

Apesar de trazer um tema aparentemente restrito, sobre “Democratização do acesso ao cinema no Brasil”, a redação do Enem deste ano ofereceu uma linha de abordagem ampla para os alunos, de acordo com Waldyr Imbroisi, professor especialista em redação do curso Aporia. Imbroisi, que também participou da avaliação, buscou discutir a padronização da cultura, onde há uma limitação a determinado conjunto de obras cinematográficas, além da segregação socioespacial, entre centro e periferia. “Dá para seguir várias outras discussões, como entender cinema como cultura e cultura como um direito. Sendo assim, poderia discutir cidadania, não cumprimento dos direitos e usar um repertório bacana quanto à isso”, exemplifica. “Tenho aluno que chegou a usar o repertório de internet, para discutir a pirataria – aumenta o acesso, mas isso não resolve o problema.”

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Conforme o professor, não eram esperados temas “polêmicos”, apesar de que o assunto poderia ser abordado em viés ideológico. “Ao mesmo tempo, um tema que tem situação de vulnerabilidade econômica, quem está menos preparado toma um susto. Se o próprio tema diz que 17% frequentam cinema, por outro lado, tem 83% de pessoas que fazem essa prova e que não, necessariamente, sabem como é sequer o modo de funcionamento do cinema. Nesse sentido, parece com o ano passado, em quem não tinha acesso ao meio digital, ficava completamente perdido com o texto sobre o Spotify”, diz. Apesar disso, Imbroisi faz uma avaliação positiva em relação à escolha do tema. “Acho que isso valoriza o aluno que sabe o que está fazendo, sabe escrever, e não o aluno que cria modelos para temas.”

Para a professora Cíntia Medeiros, da equipe de Linguagens do Colégio dos Jesuítas, o tema contou com um recorte mais simples, comparado aos anos anteriores, onde o exame cobrou análises específicas, com maior número de palavras-chaves. De acordo com a educadora, alguns estudantes questionaram se participantes que não têm acesso ao cinema conseguiriam desenvolver o assunto, em contraponto à questão do acesso ao cinema por uma pequena fração da população, mesmo assim, ela acredita que o tema poderia ser trabalhado. “O foco é justamente esse, falar sobre a questão dessa exclusão social em relação à cultura, especificamente, à cultura cinematográfica.”

Na tarde do último domingo, durante o exame, o Inep divulgou a frase temática da redação e, em um primeiro momento, muitos acreditaram que deveria ser abordado a questão da acessibilidade, já que na imagem havia um cadeirante, entretanto, os textos motivadores trouxeram a possibilidade de outras perspectivas. “Os textos traziam um viés mais voltado para a questão da desigualdade social em relação aos custos, por exemplo, desse bem cultural, e também para a questão da centralização das salas de cinema, principalmente nas regiões sudeste, nas médias e grandes cidades.”

Primeiro dia teve 376 candidatos eliminados

O primeiro dia de provas do Enem teve 376 candidatos eliminados, devido ao porte de equipamento eletrônico, ausência antes do horário permitido, utilização de impressos, não atendimento a orientações dos fiscais, entre outros. Além disso, 93 participantes foram afetados por ocorrências logísticas, como emergências médicas, interrupção temporária de energia elétrica e problemas com abastecimento de água. Nestes casos, os candidatos podem solicitar reaplicação da prova entre os dias 11 e 18 de novembro, pelo site enem.inep.gov.br/participante.A Comissão de Demandas do Inep irá julgar os casos individualmente.

Em Juiz de Fora, o Corpo de Bombeiros, em guarnição mista com o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu), atendeu uma estudante de 17 anos que passou mal durante a realização da prova no Colégio Academia, por volta das 17h. A adolescente apresentava quadro de desconforto respiratório, sendo medicada e liberada no local.

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