Um manifesto assinado por delegados da Polícia Civil de Juiz de Fora expõe a situação atual enfrentada por eles e por escrivães e investigadores lotados na 1ª Delegacia Regional da cidade. O documento, ao qual a Tribuna teve acesso, pede encaminhamento das demandas para Ministério Público, Varas Criminais da Comarca, Corregedoria-Geral da Polícia Civil, Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Defensoria Pública, Procuradoria do Estado, ao prefeito Bruno Siqueira (PMDB) e à Câmara Municipal. De acordo com o manifesto, datado de junho deste ano, as autoridades locais sofrem com o déficit de servidores, acúmulo de funções e problemas pontuais de logística. Para se ter ideia do quadro, os delegados denunciam que, em média, cada delegacia de área tem um titular, um escrivão e entre três e quatro investigadores para apurarem entre 400 e 1.300 ocorrências policias a cada mês. O resultado da defasagem são inquéritos parados e, consequentemente, falta de punição. Segundo eles, “tais questões se apresentam ainda mais evidenciadas, pois a criminalidade vem aumentando de forma assustadora”.
Os delegados justificam a elaboração do ofício como “um manifesto de resgate à imagem dos delegados de polícia em atuação na comarca. Um resgate da própria imagem da Polícia Civil, instituição que escolhemos para entregar nossa força de trabalho”. A principal preocupação diz respeito ao atraso no cumprimento de prazos estipulados pelo Poder Judiciário e Ministério Público. Os requerentes argumentam que tal fato acontece por conta da desproporção entre efetivo policial e demanda exigida. Eles também apontam que a situação não é nova, e, inclusive, já foi mostrada em reportagens da mídia local. De acordo com o documento, em maio de 2007, foi redigido outro ofício demonstrando as dificuldades enfrentadas naquela época. Porém, segundo o texto, “passados todos estes anos continuamos no mesmo lugar, para não dizer que houve uma piora significativa, um retrocesso”.
No ofício de 14 páginas ainda há relatos de outros problemas causados pela ausência de estrutura adequada para exercer os trabalhos de competência da Polícia Civil. Entre eles, há um desabafo: “Nós não estamos aguentando mais, estamos sufocados, acuados e no limite da saúde física e mental”. Isso seria resultado de problemas como aquilo que eles chamam de “desenvolvimento de múltiplas tarefas”. Ou seja, além de responderem pelo expediente de sua unidade, ainda se faz necessário atuar na cobertura de férias e licenças médicas dos delegados plantonistas, no cumprimento de escalas de sobreaviso, nas operações policiais, e outros eventos da esfera municipal, estadual e federal. Em alguns casos, isso estaria resultando até no acúmulo de competência em duas delegacias.
O documento foi encaminhado à delegada regional Sheila Oliveira. No texto, que exime a regional de qualquer culpa, os delegados pedem que o ofício seja encaminhado autoridades dos poderes Judiciário, Legislativo e Executivo, além do Ministério Público e OAB. A Tribuna tentou contato ontem com o comando da Polícia Civil em Juiz de Fora. De acordo com a assessoria de comunicação da instituição, nem o chefe do 4º Departamento (4º DPC), José Walter da Mota Mattos, nem a delegada regional iriam se manifestar sobre o assunto.
Porém, o ofício entregue em junho já resultou em repercussões, inclusive com a instauração de inquérito civil da 22ª Promotoria de Justiça da comarca de Juiz de Fora. Em 20 de agosto, o Ministério Público requisitou aos delegados para que seja entregue, em até 20 dias, a relação dos inquéritos policiais instaurados e remetidos à Justiça sem pedido de dilação de prazo para conclusão nos últimos cinco anos. Conforme o ofício, o objetivo é apurar a veracidade do manifesto lavrado pelos delegados e entregue à delegada regional.
Defasagem de dez mil servidores
O presidente do Sindicato dos Delegados de Polícia do Estado de Minas Gerais (Sindepominas), Marco Antônio de Paula Assis, esclareceu que ainda não foi informado sobre o manifesto realizado por delegados da 1ª Delegacia Regional de Polícia Civil. No entanto, ele afirmou que a situação de Juiz de Fora é semelhante à identificada em outros municípios de grande porte do estado, como Montes Claros, Uberlândia e Governador Valadares. “Para se ter ideia da situação, nossa lei orgânica estabelece como necessário 19.004 servidores na Polícia Civil em todo o estado. E hoje, em atividade, temos cerca de 8.700. Há três meses, encaminhamos ofício ao governo, solicitando abertura de concursos públicos para suprir esta demanda, mas não tivemos retorno.”
Conforme Marco Antônio, o pleito de Juiz de Fora pode resultar em desdobramentos em nível estadual, já que as muitas das reclamações locais são comuns em todas as regiões. Em agosto deste ano aconteceu um concurso público para a carreira de investigador. Mil vagas foram ofertadas para todo o estado, a expectativa é que os servidores tomem posse no ano que vem.
As autoridades locais foram procuradas ontem para falar sobre o assunto. De acordo com a assessoria de comunicação da Polícia Civil em Juiz de Fora, nem o chefe do 4º Departamento (4º DPC) nem a delegada Regional irão se manifestar sobre o assunto.