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‘Gente que fez a Tribuna’: histórias e artes de Izaura Rocha

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Cultura e emoção

Izaura Rocha
Repórter da Tribuna entre 1987 e 2003

No final de 1995, tive oportunidade de entrar para o cobiçado Caderno Dois, editoria em que muitos na Redação almejavam trabalhar. O caderno de cultura da Tribuna tinha se firmado como referência para a classe artística, e, sendo praticamente o único veículo na cidade a dar continuamente um espaço diário para os artistas locais, sempre cumpriu um papel importante na divulgação e consolidação da nossa produção cultural. Mas estávamos também atentos ao que acontecia além dos limites de Juiz de Fora. Uma das coisas mais incríveis dessa época foram os cadernos especiais que o Dois publicou sobre as megaexposições que chegavam ao Brasil: em meados dos anos 1990, o país entrou na rota de mostras internacionais que atraíam milhares de pessoas aos museus em filas gigantescas para ver Rodin (1995) e Monet (1997), duas das primeiras.

Essas exposições se restringiam aos centros culturais de São Paulo e Rio de Janeiro, raramente chegando a outras capitais e muito menos a cidades do interior. Com o objetivo de “trazer” essas mostras para o público local, começamos a cobrir algumas delas. Em 1999, eu e o fotógrafo Henrique Viard fomos ao Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro para visitar a exposição Picasso _ Anos de Guerra 1937-1945, o que resultou em quatro páginas de um caderno que se chamou Picasso _ Olhos de Gênio. A forma como a arte revolucionária do artista foi apresentada às crianças pelo educativo do MAM me chamou a atenção e foi destaque na matéria: o uso de um espelhinho duplo com uma face normal e outra de aumento foi o recurso simples para demonstrar aos pequenos a perspectiva fragmentada e os múltiplos ângulos de um objeto, como na pintura de Picasso.

No ano seguinte, o Dois publicou em quatro páginas o especial sobre Esplendores de Espanha _ de El Greco a Velázquez, que ocupou o Museu Nacional de Belas Artes do Rio de Janeiro. Foi uma exposição magnífica, que impactava não só pela importância e grandiosidade das obras, como também pela concepção cenográfica criada por Daniela Thomas, que usou cores vibrantes nos módulos da mostra. Ao percorrê-la, tive a impressão de experimentar algo próximo da chamada Síndrome de Stendhal – o mal-estar diante da grandeza da arte -, uma aceleração do coração, quase uma vertigem diante de tanta beleza.

Dois outros momentos desse tipo de maravilhamento experimentei em outro especial que tive a oportunidade de participar: em 1997, eu e o fotógrafo Antônio Olavo (Cerezo) fomos a São João del Rei e a Tiradentes para produzir uma das revistas Cidades de Minas. Em São João, de noite, já no hotel, comecei a escutar, vindo da rua, vozes, cantos e passos. Abri a janela, e era uma procissão. Uma procissão tradicional à noite nas ruas de uma cidade colonial, rumo a suas igrejas setecentistas, é de uma dramaticidade impressionante. Corri a chamar Cerezo em seu quarto: “Cerezo, está acontecendo uma procissão! Precisamos acompanhar. Vamos lá!”. Nos apressamos para registrar imagens desse momento. O segundo foi quando subimos na torre da Igreja de São Francisco para conferir outra tradição da cidade: o trabalho dos sineiros, que, com a linguagem própria dos sinos, anunciam eventos como missas, procissões ou falecimento de gente importante. Se o badalo de um sino já emociona, imagina ouvir de tão perto, os “tímpanos tomados pela música”, como descrevi.

Lindo demais.

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