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A escola não tem escolha, ou se transforma ou se transforma

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Um professor entra em sala de aula, só há lógica se pelo menos um grupo de indivíduos se encontra e GRITA, militarmente: “presente!”

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Não há ninguém.

Perdeu-se o sentido, o interesse… mas cadê o estímulo dos mestres? Essa cena é tão corriqueira que nem se percebe mais a ausência. Mesmo que estejam sentados em suas cadeiras beges enfileiradas, a cabeça vai estar em qualquer lugar que a tela ou a imaginação os levar.

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As insurgências estavam nos desenhos debochados das carteiras, que acabaram os tirando de sala de aula. Isso quando não são obrigados a limpá-las, como forma de punição por desenhar. As duas meninas que conversavam sobre a série também não estão mais lá, fazem hora no banheiro. Outros não param de tuitar sobre o tédio daquelas quatro, cinco, seis horas nas escolas, sob o peso da palavra “obrigatória”, e os que estão se permitindo penetrar no maquinário vivem cobertos pela falsa impressão de que, quietos e prestando atenção, vão estar, de fato, aprendendo. E ai de quem foge ao ritmo! Já já te indicam uma dose de Ritalina.

A geração nativa digital busca o experimentalismo, o comprometimento com o novo, a criação colaborativa, livre e coletiva, a transformação de paradigmas. E o conflito acontece quando a educação resiste a ser crítica e ajustável ao tempo presente. É preciso conectar alunos, professores e escolas em um mesmo espaço-tempo. O desencontro de gerações e olhares sobre a vida gera uma crise sistêmica irrecuperável, o mundo evolui menos com a falta de brilho nos olhos dessas crianças.

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O Brasil parece estar galgando esse avanço, embora, às vezes, ainda se encontre emoldurado por arquiteturas panópticas. Mas vale ressaltar que na década de 1980 Darcy Ribeiro já implementaria um sistema de educação integrada – os CIEPs – sob uma nova ótica, mais condizente com o que se busca hoje, 30 anos depois. Mas ok, sem lamentos, o convite do “Educa+”, série que a Tribuna lança hoje e segue durante a semana, é o de se olhar adiante! E existem educadores, escolas e pesquisadores que sonham e executam inovações. A série busca evidenciar exemplos de pequenas ações realizadas em escolas de Juiz de Fora que tiraram os alunos da mesmice passiva – mesmo que momentaneamente – e o colocaram como ativos no processo de aprendizagem. Olhando para a mudança de formatos de sala de aula, o novo papel de quem leciona, o comportamento dos discentes e o que gera valor para eles, sempre buscando a experimentação na didática.

Selecionamos alguns cases, tendo a consciência de que cada escola terá sua história sobre ser diferente. Por isso, convidamos os leitores, pesquisadores em educação ou membros ativos deste processo a nos enviar seus bons exemplos. Queremos espalhar essas ideias à comunidade como forma de inspirar muitos outros educadores. E, assim, juntos, difundirmos a cultura do que seriam as escolas do século XXI, onde tudo começa com uma fagulha de inquietação que desencadeia projetos de transformação social.

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Se você é educador ou conhece algum que já realizou ações transformadoras em escolas de Juiz de Fora, conte para a Tribuna, enviando relato e fotos para dois@tribunademinas.com.br

 

Produção de minidocs nas aulas de português

Will Paiva, professor do Colégio Equipe, incentivou alunos do ensino médio a produzirem documentários sobre os diversos tipos de violência. (Foto: Leonardo Costa)

“As escolas têm suas bases no século XIX, com educadores do século XX e alunos que nasceram no século XXI. Para conseguirmos atrair os estudantes, essa distância precisa ser diminuída”, fala Will Paiva, professor do Colégio Equipe, situado no Bairro São Mateus. Ele leciona língua portuguesa, no entanto tem trabalhado sua disciplina a partir de conceitos interdisciplinares e transversais, fazendo conexões com as vivências pessoais dos discentes. Will é um dos exemplos de iniciativas de professores que fazem diferença.

Recentemente propôs a duas turmas de 2° ano do ensino médio o exercício de refletir sobre as diversas formas de violência e transformar o que aprenderam em minidocumentários. O trabalho foi passado em uma quinta-feira, e todos, sem exceção, se engajaram na tarefa, apresentando seus vídeos na segunda. Foi preciso fazer pesquisa, leitura e saber discernir quais informações encontradas são confiáveis ou não, para que, enfim, filmassem, fizessem entrevistas e colagens com materiais gráficos e audiovisuais que encontrassem na internet. “Funciona como um letramento essa ação de buscar e ter um crivo em compreender o que é falso e verdadeiro”, comenta Will, que ficou muito surpreso com o resultado.

O primeiro passo foi o de despertar o interesse pelo tema a partir da exibição de dois filmes. Junto a isso, o professor passou textos e reportagens que tratavam os vários tipos de violência sobre diversas óticas, gerando um debate em sala de aula. A proposta dos minidocs era que os alunos produzissem vídeos acerca de um dos tipos, entre eles, bullying, homofobia, violência psicológica, violência doméstica, violência contra a mulher, violência verbal e tráfico de drogas. “Eu aprendi bastante com esse tipo de trabalho, pois ele nos aproxima do tema, exige pesquisa ao mesmo tempo em que nos dá prazer em fazer. Os trabalhos tradicionais são cansativos e acabam nos desinteressando”, diz Gabriele de Medeiros Moreira, 17, aluna do 2° ano do Colégio Equipe.

Todos esses adolescentes, desde crianças, já tinham smartphones em mãos. Cresceram produzindo vídeos, fazendo fotos e fuçando em aplicativos de edição. Por que não incentivá-los à produção de conteúdo com mais qualidade, contexto e pesquisa? “Foi a prova de que trabalhar com essas ferramentas é frutífero. Além disso, construímos conexões com outros temas a partir da violência, uma transversalidade com a ética e a moral. É essencial aliar as tecnologias à educação. Hoje, por mais que as escolas tenham infraestrutura tecnológica, as novas ferramentas são utilizadas em métodos antigos de ensino”, reflete Will.

 

As muitas inteligências

Outra questão é que alunos de ensino médio, no sistema educacional voltado para vestibulares, ficam somente restritos a esse foco, com outras temáticas muito mais importantes para a formação de caráter e que estimulem a criatividade sendo negligenciadas. Will fala a respeito das múltiplas inteligências, que às vezes são encaradas de forma rígida e singular, como se inteligência fosse atrelada a competências específicas. Comparações e noções restritas sobre esse assunto fazem com que muitos estudantes se sintam inferiorizados, principalmente no ensino médio, quando a cobrança é maior tanto na escola quanto em casa. Dessa forma, ele acredita que o trabalho de edição, criação, montagem e reportagem fez com que muitos alunos se sentissem habilidosos e valorizados. “A atividade mexeu com a autoestima de alguns alunos que não se sentem ‘inteligentes’ para o que a escola cobra”, defende o professor.

Uma das alunas, inclusive, através deste projeto, decidiu que quer ser jornalista e procurou Will para contar essa descoberta. O cinema é outra área não incentivada pelos colégios. “Esse trabalho nos tira na zona do conforto do cotidiano escolar, muitas vezes maçante, e nos dá maior liberdade de criação. Me despertou muito interesse profissional sobre as áreas de jornalismo e cinema”, conta Caroline Melo Fernandes, 16 anos. Apesar de termos faculdades de cinema em Juiz de Fora, muitos só descobrem a possibilidade de estudarem e encararem como profissão quando já estão na universidade. Essa produção totalmente amadora e experimental deu a oportunidade para que tivessem contato com a narrativa do documentário. E todo o trabalho aconteceu de forma intuitiva, visto que não houve ensinamento sobre os elementos de uma reportagem audiovisual ou linguagem cinematográfica. “As próprias mídias já estão letrando os alunos para isso”, observa Will.

Com a retomada do segundo semestre, o colégio fará uma mostra no dia 18 de agosto, unindo todos os pequenos vídeos em um só documentário. Alunos e alunas do 9° ao terceiro ano do ensino médio serão convidados a assistirem e debaterem as diversas facetas das violências que nos tiram a liberdade de ir e vir pelas ruas de nossa cidade, de sermos mulher e a liberdade de identidade de gênero.

 

Inovação pedagógica

Sobre práticas inovadoras em escolas, Thiago Almeida, pesquisador, educador e diretor de inovação pedagógica da Universidade Celso Lisboa no Rio de Janeiro, vem estudando e desenvolvendo projetos relacionados à área junto a outros nomes do Brasil. Ele defende que, assim como as instituições de ensino têm hoje um departamento de comunicação, marketing, atendimento aos pais, deveria haver uma área voltada para “inovação pedagógica.”
Não sei se pode-se enquadrar o trabalho de Will no sentido estrito do termo “inovação pedagógica”, adotado por Thiago. No entanto, diante das barreiras que o professor enfrenta por precisar seguir padrões curriculares e da dificuldade em despertar o interesse e participação dos alunos, sem dúvida, essa construção de conhecimento, compartilhada por meio de um projeto que foge ao usual, mostra a importância dessas pequenas ações para transformar o modo como os alunos podem aprender de forma reflexiva sobre um conteúdo.

Decifrando melhor o termo, ‘inovação’ é uma invenção que gera algum valor para as pessoas, valor no sentido de resolver uma questão, que pode ser, por exemplo, gerar conhecimento – de maneira eficaz – aos alunos. Ou seja, “inovação na forma de aprender uma coisa nova”, explica. Nesse sentido, de nada vale a instituição gastar muito do orçamento com PCs de última geração, tablets, telas, se não há uma maneira nova em criação de processos de aprendizagem. “Tecnologia não é inovação. Quadro interativo não muda a forma de o aluno aprender, assim como jogos, computadores, smartphones e gamificação. O que faz a mudança é o professor pensar em um novo design de aprendizagem do estudante, que seja elaborado de forma inovadora, para os alunos de fato se sentirem engajados e motivados”, defende Thiago.

 

É preciso envolver e instigar

O que acontece hoje em relação à evasão de discentes nas salas de aula e completo desinteresse tem muito a ver com a falta de preparo e até mesmo entusiasmo de alguns professores de ensino fundamental e médio. Sobre aquela distância de tempo que Will Paiva ressaltou, Thiago defende a inovação pedagógica como “uma oportunidade de sincronizar essas dimensões em um mesmo tempo histórico”.

O educador corrobora o problema de todo sistema educacional girar em torno do ENEM e/ou provas para ingressar em alguma faculdade, no sentido de que não se vê vantagem em tentar uma aplicabilidade de conceitos inovadores, uma aprendizagem baseada em projetos, por exemplo. Ao invés de somente simulados e aulas expositivas, com o aluno sempre passivo. Nessa nova ótica, o professor não faz uma exposição de teorias e conteúdos previamente antes da realização do trabalho. Ele dá um problema real para que os alunos desenvolvam uma solução, sem que estes saibam o que vão aprender, mas o professor sabe. Tudo vai depender do engajamento e esforços de cada um, e eles chegarão lá quase que sozinhos. É instigante, prático e faz com que os alunos desenvolvam novas habilidades, bem como interajam com a escola, os colegas, o professor e até mesmo a comunidade como um todo.

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