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Viagem rumo a um universo cheio de cores e formas fantásticas

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A poeta e psicóloga Luciane Fontes estreia na literatura infantil com “A lupa mágica”, livro que aborda a temática da acessibilidade e da inclusão social – Foto Divulgação

A poeta e psicóloga Luciane Fontes encerra o ano de 2020 estreando na literatura infantil. Concebido com ilustrações assinadas por Sabrina Santiago, que deu muitas cores ao livro, “A lupa mágica” (Paratexto, 24 páginas) aborda a temática da acessibilidade e da inclusão social por meio da história do Carlinhos, um menino de 11 anos que tem baixa visão. Ainda assim, ele sai sozinho pelas ruas, estuda, tem amigos como qualquer criança e é muito alegre, o que, de acordo com a autora, desconstrói a imagem que se tem, normalmente, da pessoa com deficiência.

“Ele apresenta desenvoltura e leveza em relação à deficiência visual com a qual convive desde os oito anos de idade. Além disso, como toda criança, possui muitos sonhos e fantasias, uma das quais é relatada no livro”, comenta Luciane, que, há 14 anos, foi diagnosticada com Pseudoxantoma Elástico, uma doença genética rara e irreversível que afetou sua visão. Na opinião dela, é preciso, urgentemente, abordar a temática da obra não só com os pequenos, mas também com jovens e adultos.

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Mineira de Guiricema, mas radicada em Juiz de Fora, a escritora é mestre em Psicologia/Pisicanálise e membro da Liga de Escritores, Ilustradores e Autores de Juiz de Fora (LeiaJF). Escreveu “Quereres” (2006), “Psicanálise versada” (2017), “Paixões do ser” (2017), “Livros na estante” (2017) e “O Homem sem memória” (2018). “A lupa mágica” também ganhou uma versão em audiolivro, produzida pela Fundação Dorina Nowill, referência quando o assunto é inclusão de pessoas com deficiência visual, e ela está disponível, gratuitamente, no site da autora. Na história, Carlinhos esbarra em um objeto mágico que aumenta o tamanho das coisas. A partir daí, ele segue rumo a um universo cheio de cores e formas fantásticas. Luciane convida os leitores a embarcarem nessa viagem com o garoto.

Marisa Loures – Esta é sua primeira incursão na literatura infantil. Como é escrever para as crianças?

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Luciane Fontes – Foi uma experiência incrível. Acho que deixei minha criança interna falar, dei voz a ela. Foi libertador, porque depois desta vieram outras histórias, pura invencionice de criança. Tem sido divertido, mas exige muita cautela e pesquisa, pois o público-alvo, sabemos, é um sujeito em desenvolvimento. Precisa ser lúdico, mas com cuidados educativos.

– Quando publicou “Livros na estante”, seu ponto de partida foi a necessidade de elaborar e dar um sentido para o que você estava vivendo. Agora, o que a motivou a abordar a temática da acessibilidade e da inclusão social em um livro infantil?

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Precisamos falar desse assunto com todos: adultos, jovens e crianças. Podemos levar informação através de diversos canais, e a literatura é um desses canais. A motivação inicial não foi essa, apenas utilizei-me de uma fantasia que é o meio através do qual expressamos um desejo. A criança verbaliza suas fantasias o tempo todo. Os adultos as recalcam.

– Na nossa conversa em 2018, você me disse que o deficiente visual ainda era visto como um ser estranho, com o qual não se sabe muito bem o que fazer e/ou como fazer. Alguns, inclusive, vivem exilados. Já o Carlinhos é um menino alegre, tem amigos. Todos os dias, por exemplo, ele espera o Paulinho para ir com ele para a escola. Na vida real, como a criança lida com o amiguinho que é deficiente visual?

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 – Nós já passamos por momentos mais difíceis de extrema segregação. Vale lembrar as salas especiais. As crianças com deficiência não podiam dividir a mesma sala de aula nem o intervalo (o denominado “recreio”), que é um momento de descontração e convivência. Em conversa com uma professora e doutoranda que tem um trabalho com crianças com deficiência visual, Luciane Nobre, ela me relatou que, quando houve um afrouxamento dessas normas e uma “permissão” para o convívio, notava-se certo receio de que a cegueira pudesse ser contagiosa acarretando certa evitação do contato. Com as políticas de integração, as famílias passaram a se aproximar das crianças com deficiência e houve uma mudança de atitude, mas no sentido de hiperproteger para não machucar, supondo uma grande fragilidade por parte dessas crianças. A política de inclusão busca promover o compartilhamento de experiências e o respeito às diferenças, mas estamos longe de uma prática inclusiva de fato. As crianças acolhem e convivem bem, mas não temos ambientes inclusivos, o que implica dizer espaço físico adaptado às necessidades de cada um com amplo acesso à informação e comunicação e, principalmente, pessoas esclarecidas e com atitudes inclusivas. Para que mudanças ocorram, é preciso que haja não só informação, mas principalmente sensibilização das pessoas a respeito do assunto, criando uma empatia com o outro nessa condição. Condição na qual poderemos estar qualquer um de nós em algum momento da vida, de forma provisória ou definitiva.

 – O livro traz informações sobre as cores das bengalas e a classificação estabelecida pela OMS para deficiência visual. Por que é importante apresentar essas informações para as crianças?

Acho importante esclarecer sobre o uso das bengalas com as especificidades de cores para que as pessoas compreendam o significado e saibam como lidar. A bengala verde pode ser usada por pessoas com baixa visão que por si já compreende diversas possibilidades e não pode ser corrigida com uso de lentes apropriadas, como óculos de grau: a pessoa pode enxergar um pouco o que está à sua frente, mas não o que está ao seu lado, pode ter a visão embaçada, mas conseguir ler, em letras grandes ou com a ajuda de uma lupa, uma mensagem no celular. Houve casos de pessoas serem insultadas no ônibus, por exemplo, por usarem bengala, assentarem no preferencial e estarem olhando o celular. A bengala branca com uma fita vermelha indica que o usuário tem deficiência visual e auditiva. Nesse caso, a abordagem precisa ser diferente. A bengala branca é usada por pessoas cegas.

– Nós sabemos que os gatilhos para o gosto ou o desinteresse pelos livros são disparados na infância. Quando vi a temática do seu livro, logo pensei em como os livros chegam às crianças com deficiência visual, quais formatos são oferecidos a elas de modo que possam despertar seu interesse. Como fazer com que a experiência de leitura de uma criança com dificuldade de visão seja prazerosa e enriquecedora?

O acesso da criança aos livros se dá pelo livro tátil, e-book e audiolivro. O audiolivro é um livro falado com entonação apropriada e busca descrever imagens e palavras. Desta forma, a criança consegue ter acesso a todo o conteúdo do livro. É a forma mais acessível para o deficiente visual, principalmente criança.

– “A lupa mágica” é um livro com muitas ilustrações e muitas cores. Como autora e ilustradora trabalharam o diálogo entre texto e imagem?

Como disse anteriormente, o livro veio com a construção de uma fantasia, que é uma fantasia de toda criança que tem baixa visão: querer ver com detalhes, forma e cor o mundo à sua volta. Além disso, a lupa exerce certo fascínio sobre a criança por aumentar o tamanho das coisas. No entanto, utilizei-me da fantasia de Carlinhos para mostrar um pouco o universo de uma pessoa com deficiência visual, de como ela pode ter acesso aos lugares, à leitura e comunicação, às brincadeiras e convívio social.

– O que está planejado para “A lupa mágica”? Quais caminhos ele vai percorrer a partir de agora?

Quero levá-lo às escolas, contar a história do Carlinhos e ouvir histórias de outros Carlinhos. Pretendo realizar uma oficina de sensibilização com as crianças para que elas possam se colocar no lugar da pessoa com deficiência, e, desta forma, contribuir um pouquinho para que a nossa sociedade, um dia, possa ser efetivamente inclusiva.

“A lupa mágica”

Autora: Luciane Fontes

Ilustradora: Sabrina Santiago

Editora: Paratexto (24 páginas)

A versão em audiolivro de “A lupa mágica” está disponível no site da autora.

Assista aqui à live de lançamento do livro.

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