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Aline Bei: “fui levada para a escrita quando percebi que pessoas vivas escreviam. e tinham sonhos”

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Um dos grandes destaques da literatura contemporânea, Aline Bei conversa com a Sala de Leitura sobre “O peso do pássaro morto” e “Pequena coreografia do adeus” – Foto Lorena Dini

Aline Bei é do teatro. Os palcos vieram antes da escrita. Formou-se em Artes Cênicas pelo Teatro-Escola Célia Helena. Depois, cursou Letras na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. E sua literatura, conhecida em 2017 com o lançamento de “O peso do pássaro morto” (Editora Nós, 168 páginas) — vencedor do Prêmio São Paulo de Literatura e do Prêmio Toca, criado pelo escritor Marcelino Freire, — estreou performática e poética. Parece ter sido gestada para ser lida em voz alta.

Depois, em 2021, veio “Pequena coreografia do adeus” (Companhia das Letras, 264 páginas), e vimos ali, mais uma vez, uma mistura de teatro com poesia. Ao ler os livros de Aline, tenho a impressão de que as palavras brotam com muita leveza.

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“é porque fico perto do fogo. por exemplo agora, estou perigosamente perto do fogo.também porque abro uma página de Clarice pela manhã.ou de Lygia. ou de Hilda. Escrever, antes de tudo, é ler”, contou-me, por e-mail, a escritora paulista. Nos dois romances, Aline quebra frases, troca as maiúsculas pelas minúsculas, brinca com os sinais de pontuação e com o ritmo. Um estilo muito particular e que foi mantido nesta entrevista. “nunca alcancei a poesia enquanto escrevo. às vezes, na vida, tenho a impressão de ter sido testemunha de algo lírico. Isto me fará escrever, penso. e estou sempre certa quanto a isso. mas não toco a poesia. como não se toca um pássaro em movimento.”

Marisa Loures- Aline, você é do teatro. Como essa sua experiência com os palcos te levou para os livros?

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Aline Bei – os livros sempre foram meus. o palco (ou a ausência dele) de certa forma me levou para a escrita. também fui levada por poetas que conheci na universidade e ainda sem mentir, posso dizer que fui levada quando percebi que pessoas vivas escreviam. e tinham sonhos. resumidamente, fui levada pela carne e pelos ossos. pelos olhos. pelas mãos.

– O teatro te levou para a literatura. E depois você fez Letras. De que forma a Academia contribuiu com seu estilo de escrita?

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meu maior ganho em solo universitário foi Manoel de Barros. e um professor de literatura chamado Joka, que me apresentou Manoel de Barros. além de me dizer, Aline
a literatura é um lugar
para você.

– Em “O peso do pássaro morto”, a personagem não tem nome, e o livro narra a vida dessa mulher em diferentes fases, vida que é muito marcada pelas perdas. Apesar disso, é possível perceber o amadurecimento dela. Muitas pessoas que já leram o livro destacam essa questão de uma mulher em busca da superação de traumas. Você é uma mulher muito nova se comparada à personagem. Como foi lidar com os seus sentimentos a fim de trazer essa mulher para o papel?

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eu trouxe no bolso o verbo perder e a protagonista do Pássaro me apareceu como atriz. estou disponível para o jogo, ela me disse. juntas fomos contando o que esse verbo quis, em cena, conjugar.

– Em “Pequena coreografia do adeus”, Júlia Terra é a personagem e, mais uma vez, é uma mulher que você traz para sua escrita. Sabemos que a literatura, ao longo do tempo, é marcada por grandes personagens do universo masculino. Trazer a mulher e o universo feminino para as páginas que você escreve é uma questão importante para você?

 não persigo sozinha meus assuntos, eles também me perseguem. não sei o que será em cinco anos. em dez anos, como estará a minha pesquisa. por enquanto, meus temas têm sido cíclicos.

– É claro que muitos leitores acabam confundindo a Aline Bei com as suas personagens. O que elas têm de você?

 absolutamente nada. completamente tudo.

– Por falar em leitores, a gente percebe que você tem uma relação muito grande com eles. O seu Intagram é uma prova disso. Qual é a importância que essa sua relação com os leitores tem para sua obra? Acredito que, depois do primeiro livro, esse diálogo tenha crescido e te influenciado.

sou pura escuta das pessoas que me leem. elas sabem da minha escrita de uma forma que eu nunca saberei. é como o nosso próprio rosto para sempre inacessível. espelhos e fotos não resolvem. o ponto cego se mantém. meus leitores são o lugar onde fico mais perto da minha escrita.

– Você é uma autora de livros que vêm conquistando muitos leitores. Como professora de língua portuguesa do Ensino Médio, já vi muitas alunas lendo as suas obras e elogiando sua literatura, o que me deixa superfeliz considerando que, com frequência, temos que lutar muito para que os adolescentes leiam. Agora você está escrevendo um novo livro. Sabendo disso, aumenta a preocupação em lançar uma obra que toque o leitor tanto quanto as outras?

minha preocupação enquanto escrevo é ouvir o centro do livro, a matéria da qual ele é feito.
um livro

existe antes de nascer em livro. o que faço é transpor a coisa de um plano para o outro
(sem matá-la). procuro manter as mãos macias, ainda que firmes.

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