A poesia simplesmente aconteceu na vida da Renata. Ela ainda era uma menina quando foi estimulada a falar e a escrever versos. Alguns anos se passaram e, em 2009, lançou o blog Doce de Lira, onde começou a publicar seus escritos, recebendo, desde então, a alcunha de Confeiteira. Entre as poetisas que admira, está a atriz Elisa Lucinda. E não é que, em dezembro de 2012, ela pôde realizar o sonho de fazer parte de uma das turmas de poesia falada que Elisa ministra na Casa Poema, no Rio de Janeiro!
Por essa época, Renata já tinha o projeto do livro “Doce de lira, poesia à mesa” devidamente aprovado pela Lei Murilo Mendes e deixou seus poemas com a atriz. Para sua surpresa, alguns dias depois, recebeu um telefonema. Ali, ficara sabendo que o prefácio de sua obra de estreia seria assinado pela escritora que tanto admirava.
“E, como ela mesma revelou, o texto foi precedido de um encontro na casa dela, uma tarde inteira dedicada ao meu livro, com a leitura individualizada de cada poema em voz alta. Costumo brincar que aquele parece ter sido um dia que não existiu, tamanha a significância do encontro. Foi um presente – não consigo encontrar outra palavra”, conta a poeta juiz-forana, que, sete anos depois do encontro com Elisa, é uma autora de três livros publicados. Também enviou para as livrarias os infantis “Mano amigo”, já esgotado, e o novíssimo “Queria ficar por aqui”, o volume inaugural da Coleção Pequeno Filósofo.
Renata de Aragão Lopes é servidora pública federal. Bacharela em Direito pela UFJF, pós-graduada em Direito Público e em Arte e Educação. Na entrevista ao Sala de Leitura, ela fala sobre os 10 anos da Doce de Lira, projetos de novas publicações, o amor pela poesia e as reflexões que seu novo personagem, o Natan, nos proporciona.
“Natan é um menino nascido após o advento da internet – por isso, chamado de nativo digital. Familiarizado com tecnologia e encantado por games, é muito inteligente, arguto e contestador. Questiona regras e verdades estabelecidas por gerações anteriores, expondo, precocemente, uma nova visão de mundo. Fala de seus valores com muita convicção e sempre propõe o diálogo, insurgindo-se contra o exercício da autoridade. Embora inspirado em meu filho, o personagem retrata, na verdade, a criança da atualidade: conectada, brilhante, inventiva e espirituosa.”
Marisa Loures – Como surgiu Doce de Lira? E qual é a proposta?
Renata de Aragão Lopes – Doce de Lira surgiu como nome do meu blog de poesia, inaugurado em abril de 2009. A proposta dessa confeitaria poética, desde o começo, foi a de apresentar o gênero poesia como uma leitura prazerosa e acessível a todos, rompendo-se aquela ideia de que se trata de literatura de elite e de difícil compreensão. Doce de Lira é a prova de que poesia é fácil, gostosa e merece se tornar hábito na vida de qualquer pessoa.
– Já são 10 anos do blog Doce de Lira e do apelido de Confeiteira. O que ele trouxe para você?
– Ser a Confeiteira do Doce de Lira, ao longo desses 10 anos, só me trouxe certezas e alegrias. Entre as certezas, a de que amo escrever e a de que a escrita se tornou, de fato, realidade e compromisso na minha vida: já tenho três livros publicados, outros organizados e sigo escrevendo em fluxo constante, com uma vontade enorme de produzir cada vez mais. E, entre as incontáveis alegrias, posso citar a de ter o meu trabalho reconhecido, a de constatar que minha poesia efetivamente alcançou e agradou tantas pessoas, a de perceber quantos encontros e amigos a literatura já me proporcionou.
– Você tem formação na área de direito e se enveredou para a literatura. Como sua história literária começou?
– A verdade é que a Literatura é anterior ao Direito na minha vida. Desde bem menina, com os estímulos da minha mãe e a escuta da minha avó, escrevo e falo poesia. Os primeiros poemas me vieram por volta dos 9 anos de idade, e essa inclinação poética também foi logo percebida e incentivada por professores em meu ambiente escolar. O curioso é que essa paixão pela Literatura não me levou a cursar Letras. Eu pensava em Comunicação, mas acabei prestando vestibular apenas para Direito. Completei, há pouco, 21 anos de serviço público na área jurídica e reconheço o quanto a escrita técnica que desenvolvo no trabalho me mantém ativa, conhecedora da gramática e apaixonada pela Língua Portuguesa. Ao longo de todo esse período, a poesia sempre esteve comigo. Vez ou outra, participava, com êxito, de concursos literários, tendo meus poemas publicados em obras coletivas ou classificados para apresentação em festivais. Mas foi apenas em 2009, com o apoio da família e de amigos, que realmente passei a divulgar minha produção literária, com a criação do blog Doce de Lira. Quatro anos depois, como resultado de toda essa trajetória, veio, enfim, o primeiro livro: “Doce de lira, poesia à mesa”, publicado com o incentivo da Lei Municipal Murilo Mendes.
“E é exatamente o que penso sobre poesia: ela acontece. Desde sempre, parece falar mais à minha alma. Hoje, compreendo que gosto da subjetividade, da musicalidade, da infinitude de leituras possíveis que um poema oferece.”
– Desde menina, você sempre foi mais da poesia do que da prosa. Por que a poesia?
– Não sei dizer ao certo o porquê da minha inclinação, tão cedo, à poesia. Não me recordo de, na infância, haver sido influenciada por alguém a ler ou a escrever mais poesia do que prosa. Simplesmente aconteceu. E é exatamente o que penso sobre poesia: ela acontece. Desde sempre, parece falar mais à minha alma. Hoje, compreendo que gosto da subjetividade, da musicalidade, da infinitude de leituras possíveis que um poema oferece. Sei também que a poesia me leva ao palco, lugar que sempre amei e que me fez experimentar o teatro e o cinema por um tempo. Sei, por fim, que a poesia ainda me possibilita a alegria de parcerias musicais, pois já tenho poemas musicados por compositores locais. Mas o fato é que todas essas observações vieram bem depois. Meu encantamento e predileção por poesia é mistério.
– Qual livro seu você recomendaria para que um leitor conheça a essência de sua obra?
– Recomendo o primeiro livro: “Doce de lira, poesia à mesa”. É ali que o leitor claramente vai identificar minha voz, estilo e proposta literária. Não que os outros dois já publicados não me revelem. Muito pelo contrário. É que “Mano amigo” e “Queria ficar por aqui” dirigem-se ao público infantil, segmento para o qual tenho propostas específicas. Entre elas, a de que a literatura propicie uma real aproximação afetiva entre adultos e crianças.
“Gosto muito desse entrelaçamento entre Arte, Literatura e Educação. É assim que escrevo para o público infantil: a partir dessa vontade imensa de que se possa educar melhor as crianças, sempre com diálogo, afetividade e poesia.”
– Embora eu acredite que o livro “Queria ficar comigo” defenda a importância do que dizem, por exemplo, nossos avós, também acho que abre a questão de que é necessário convencer a criança através do diálogo. Sem muitas imposições…
– Sim, a geração atual questiona o exercício da autoridade e requer explicações o tempo inteiro. Diferentemente das gerações passadas, não aceita, por exemplo, o simples “não” como resposta, querendo entender o porquê da negativa. É a geração da informação e do diálogo. E isso tem desafiado familiares e educadores. Por isso, nomeei a Coleção Pequeno Filósofo como sendo para ler, conversar e colorir. Minha proposta vai muito além de livros de estória. O que faço é convidar familiares e educadores a conversarem com as crianças após a leitura, inclusive já identificando, ao final do livro, os temas sugeridos pela obra para debate. No primeiro volume, “Queria ficar por aqui”, proponho, por exemplo, temas corriqueiros (como necessidades de rotina, organização e disciplina) até questões mais filosóficas (como o que seriam felicidade e saudade). Por fim, ainda é possível colorir o livro, que possui todas as ilustrações em preto e branco. Gosto muito desse entrelaçamento entre Arte, Literatura e Educação. É assim que escrevo para o público infantil: a partir dessa vontade imensa de que se possa educar melhor as crianças, sempre com diálogo, afetividade e poesia.
“Pais e educadores costumam, sim, criticar a geração atual, lamentando que as crianças de hoje não tenham a infância que tiveram. Isso é tão curioso. De que lugar esses adultos falam? Como podem supor terem sido crianças mais felizes que as atuais? Aliás, o que seria felicidade? O mundo de hoje é outro: globalizado, sem fronteiras, dinâmico, veloz. Cada tempo inaugura um estilo de vida próprio.”
– Também falta ao adulto entender que é necessário aceitar os padrões de comportamentos da nova geração? Os mais velhos têm que parar de colocar a culpa nas novas tecnologias? E aí penso que a incompatibilidade entre as gerações vem justamente daí. Pais e professores “brigando” com a criança por ela não querer ler um livro escolhido para se trabalhar em sala de aula…
– Recentemente, tive a oportunidade de escrever sobre isso em uma matéria para a Revista Viver e Crescer. Pais e educadores costumam, sim, criticar a geração atual, lamentando que as crianças de hoje não tenham a infância que tiveram. Isso é tão curioso. De que lugar esses adultos falam? Como podem supor terem sido crianças mais felizes que as atuais? Aliás, o que seria felicidade? O mundo de hoje é outro: globalizado, sem fronteiras, dinâmico, veloz. Cada tempo inaugura um estilo de vida próprio. A cada século, o ser humano se adapta e se reinventa. Não vejo razão, portanto, para se criticar a geração atual e censurar a tecnologia. Temos, sim, é que tirar proveito de tudo que a era digital nos possibilita – e, claro, sempre preservando e apresentando às crianças aquilo que já valorizávamos: a brincadeira ao ar livre, os jogos de tabuleiro, o livro no papel, a visita aos familiares, o conversar pessoalmente, etc.
– Já há novos livros vindo por aí?
– Da Coleção Pequeno Filósofo, já tenho mais dois volumes escritos, apenas pendentes de ilustração e produção. Acredito que o segundo volume será publicado já no primeiro semestre de 2020. Ainda para o público infantil, tenho dois outros projetos em andamento: livros de poesia já iniciados, mas ainda não concluídos. Paralelamente a isso, atendendo a pedidos de um “segundo” “Doce de lira”, estou organizando meu próximo livro de poesia. Pretendo publicá-lo tão logo conclua o trabalho.
– Como faz seus livros circularem?
– “Mano amigo” encontra-se esgotado. Já cogito, inclusive, providenciar uma segunda tiragem. “Doce de lira, poesia à mesa” e “Queria ficar por aqui” encontram-se disponíveis na internet e em algumas livrarias de Juiz de Fora (como Espaço Excalibür e Ca d’Ori). Além disso, escrevo para a Revista Viver e Crescer, visito escolas, participo de feiras e saraus, promovo workshops sobre poesia, realizo oficinas literárias e ministro palestras sobre navegação segura na internet – atividades que acabam dando bastante visibilidade à minha produção literária. Por fim, divulgo meus livros e produtos Doce de Lira (camisetas, postais e brinquedos artesanais) no site www.docedelira.com.br e nas redes sociais: Doce de Lira no Facebook, e @docedelira no Instagram, aceitando encomendas de livros com dedicatória, autografados.
120 páginas
20 páginas
“Queria ficar por aqui:
” 24 páginas