Devo confessar que nesse quase um ano em que “Trem bala”, da doce Ana Vilela, toca nas rádios insistentemente e circula feito vírus nas redes sociais, nunca parei para prestar atenção no que diz a letra. O “correr contra o tempo” sempre me fez deixar o saborear um simples momento da vida para depois. Foi numa tarde, enquanto dirigia rumo a um dos compromissos diários, que me deixei embalar pelo simples que diz a canção. “Segura teu filho no colo/ Sorria e abraça os teus pais enquanto estão aqui/ Que a vida é trem-bala parceiro/ E a gente é só passageiro prestes a partir.” Resultado? Chorei copiosamente até meu destino.
Dias depois, descubro que a canção que me arrebatou naquele momento foi transformada em livro. “Trem bala” (Editora Voo, 62 páginas) chegou para nós com a proposta de ser um livro presente. Por isso, a publicação tem capa dura e projeto gráfico de encantar os olhos. Casam harmoniosamente a canção da paranaense Ana Vilela e as ilustrações delicadas e sensíveis da mineira Anna Cunha. A obra está inserida no projeto Um por Um, da Voo, o que faz com que cada exemplar vendido viabilize uma aula de música para uma criança da Fundação Playing For Change Brasil, de Curitiba. As doações podem ser acompanhadas no site da editora www.editoravoo.com.br.
“Acho isso fundamental porque a música mudou minha vida em muitos sentidos. Ela tem esse poder muito forte. Às vezes, a gente presta mais atenção na música, ela te toca muito mais do que ler alguma coisa. Não que o livro não seja importante”, dispara Ana, que passa pela capital mineira dia 15 de novembro, quando fará show e receberá o público para sessão de autógrafos.
Na entrevista concedida ao Sala de Leitura, a compositora conta que recebe de volta dos milhares de admiradores que seus versos têm tocado muitas pessoas de diferentes formas. Neste momento, quando escrevo esse texto, “Trem bala” rola no meu notebook e afirmo que, a despeito de qualquer divergência, a música, em algum trecho, dialoga com o que há de humanidade em cada um de nós. Então, vale ressaltar aqui: “a gente não pode ter tudo/ Qual seria a graça do mundo se fosse assim?/Por isso eu prefiro sorrisos/E os presentes que a vida trouxe pra perto de mim.”
Marisa Loures – Você sempre conta que um dia teve uma conversa com seu avô daquelas que faz a gente pensar. E, de repente, você sabia o que realmente era importante na sua vida. Como foi esse momento?
Ana Vilela – O momento da conversa com meu avô foi o momento em que eu estava afastada de tudo, estava me descobrindo sozinha. E aí meu avô chegou para conversar comigo e falou: “Você não presta mais atenção nas pessoas que estão ao seu redor. Acho melhor você parar um pouquinho. Cadê seus amigos que viviam aqui em casa?” Aí, acho que foi isso que me atentou para escrever a música, entre outras coisas.
– Como é a Ana Vilela de antes e depois do sucesso de “Trem bala”?
– Mudou muita coisa de dentro para fora e de fora para dentro. A gente acaba tendo que lidar com responsabilidades que, normalmente, uma pessoa de 19 anos, geralmente, não precisa. Então, é muito louco, você tem uma empresa, é responsável por uma carreira toda, é responsável por outras pessoas. Muita coisa mudou para melhor. Estou muito feliz. Acredito que eu esteja mais madura também.
– A música diz para ficarmos ao lado de quem a gente ama. Com tantos compromissos, você consegue usufruir o que sua letra propõe?
– Pouco. Menos do que eu gostaria. Na verdade, estou viajando bastante, fico pouco tempo em casa. Mas, quando estou, procuro curtir todo mundo, minha família, meus amigos. A gente sempre se vê, procura fazer alguma coisa para ficar junto.
“Acho que, de maneira geral, sim. A maioria de problemas que a gente tem hoje no mundo seria facilmente resolvida se a gente tivesse um pouquinho mais de compaixão, de respeito ao próximo. Então, acredito que falta sim. Acho que é muito de prestar atenção, de olhar ao redor, de se lembrar das coisas que são importantes mesmo.”
– A letra da música pede para aproveitarmos os bons momentos da vida. É algo tão simples, mas as pessoas parecem tão distantes disso. Falta amor na nossa sociedade?
– Acho que, de maneira geral, sim. A maioria de problemas que a gente tem hoje no mundo seria facilmente resolvida se a gente tivesse um pouquinho mais de compaixão, de respeito ao próximo. Então, acredito que falta sim. Acho que é muito de prestar atenção, de olhar ao redor, de se lembrar das coisas que são importantes mesmo.
– Você acha que essa música pode ajudar as pessoas a repensarem sobre suas relações?
– “Trem bala” tem dado esse resultado para a gente, graças a Deus. E a galera tem dado um feedback muito positivo, tem falado que a música ajudou nas relações familiares, ajudou a ver a vida de outro jeito. Isso é maravilhoso. A música, no geral, tem o poder de fazer isso com as pessoas. Acho que a gente acaba pensando mais sobre certos assuntos se curte uma música que nos toca do que se a gente lê algo em algum lugar.
– A música já tocou milhares de pessoas. O que representa transformá-la em um livro?
– É um sonho que sempre tive de ter um livro, de poder publicar um livro. A ideia veio de poder entregar a música de presente mesmo, porque a gente sentiu que a galera tinha a necessidade e tratava a música como um presente. Sempre encontrava gente que falava: “ah mandei sua música para minha filha”. Então, a gente pensou: “porque não transformá-la num presente de verdade?” Estou extremamente feliz. Era algo que eu queria muito ter feito, e a gente está fazendo junto de um pessoal muito competente.
– A música emociona todas as idades. E o livro, é voltado para qual público?
– Acho que todo mundo que gosta da música gosta do livro, porque a gente teve a preocupação de não fazer as ilustrações parecerem infantis. A Anna Cunha, a artista que fez as ilustrações para a gente, é uma pessoa maravilhosa, os traços dela são muito maduros. Foi a pessoa que a gente pensou primeiro.
– E você acompanhou todo o processo de produção do livro?
– Sim, tudo foi passado para mim. Eu ia recebendo todas as imagens para ver se combinavam, davam certo. Mas acabou que foi muito orgânico, muito natural. As nossas ideias bateram sem querer. O que está no livro é muito do que a gente sentiu que ia dar certo de primeira.
– O que sonha para sua carreira?
– Gosto muito de escrever, já estou escrevendo o segundo livro, inclusive. Ele vai contar um pouquinho da minha história. Como cantora e compositora, ainda tem o disco para lançar. Neste mês de outubro, o disco vai sair e vai ajudar a turnê. Estou muito ansiosa, quero muito que dê certo logo, que as pessoas também curtam os outros trabalhos tanto quanto “Trem bala”.
“Tenho consciência de que nada vai acontecer tão grande quanto foi ‘Trem bala’. “Trem bala” foi um começo incrível, mas foi uma coisa fora do comum, fora do que acontece normalmente. A música está com quase um ano e está com o mesmo fôlego em rádio e na internet. Sei que não posso esperar a mesma coisa, sei que vou me frustrar bastante se eu esperar que todas as minhas músicas sejam a mesma coisa que aconteceu com ‘Trem bala'”.
– Por falar nisso, em uma entrevista, você disse que tem a preocupação de ter os melhores por perto para que essa visibilidade não seja passageira. Na hora de compor, bate medo de as outras canções não darem certo como “Trem bala”?
– Na verdade, não, porque tenho consciência de que nada vai acontecer tão grande quanto foi “Trem bala”. “Trem bala” foi um começo incrível, mas foi uma coisa fora do comum, fora do que acontece normalmente. A música está com quase um ano e está com o mesmo fôlego em rádio e na internet. Sei que não posso esperar a mesma coisa, sei que vou me frustrar bastante se eu esperar que todas as minhas músicas sejam a mesma coisa que aconteceu com “Trem bala”. E algumas delas já estavam prontas. Então, não teve essa preocupação de “ah, vou compor uma música para ser melhor que Trem bala”. As coisas saem em mim em forma de composição muito naturalmente, não tenho muita pressão na hora de compor. Só componho se estou sentindo.
“Trem bala”
Autora: Ana Vilela
Editora: Voo (62 páginas)