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Tudo em todo lugar ao mesmo tempo

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Imagem da janela onde assisto espetáculos diários da minha cosmolocalidade

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Moro no mesmo endereço em que nasci. Convivo com árvores do quintal da minha infância. Ainda tenho vizinhos que me viram chegar a este mundo e crescer pelas ruas de paralelepípedo. Nunca morei em outra cidade, embora me sinta em casa em várias delas. Nunca viajei ao exterior, mas conheço na palma da mão lugares famosos pelo mundo, e até pisei digitalmente na lua.

Da janela de casa, vejo espetáculos naturais gratuitos na vastidão incrementada por dois cartões-postais: o Morro do Cristo e o Mirante de São Bernardo com a capelinha construída a partir de iniciativa do visionário Bernardo Mascarenhas. Nela, comunguei pela primeira vez, e experimentei, para nunca mais esquecer, a simbologia e o sabor do sagrado que ultrapassa os limites das religiões. “O Universo é muito maior do que você pensa”.

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Minha Juiz de Fora é uma cosmolocalidade, e não poderia deixar passar em brancas nuvens o que é viver nela, na semana em que essa terrinha completou 172 anos de emancipação. Aqui vivo “Tudo em todo lugar ao mesmo tempo”, título do filme que abre as fronteiras do multiverso, e que tive a oportunidade de assistir antes mesmo dele chegar às telonas brasileiras em 23 de junho próximo. Cidade alguma é limite, ainda que a gente nunca saia dela. Hoje ainda muito mais que antes.

Gostar ou não de morar em algum lugar tem muito a ver com o jeito como a gente olha para ele. Com que olhos você enxerga Juiz de Fora? Tenho me desafiado a buscar dimensões desconhecidas, como ocorre com a personagem principal no filme dos jovens e já aclamados diretores americanos Daniel Kwan e Daniel Scheinert. O que vejo são periferias pulsantes de vida com trânsito intenso de gente, de bicho, de bicicletas, de carros que me expandem a consciência sobre o que é habitar. Sim. “O Universo é muito maior do que você pensa”.

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Tanto na ficção, quanto na vida real, o maior inimigo, seja no âmbito coletivo ou individual, é a desesperança provocada pelo descrédito no futuro.

Ando de ônibus e procuro diversificar as linhas não apenas porque não sei dirigir, como também por acreditar e gostar do que é coletivo. Sinto prazer em me sentar ao lado de desconhecidos, ouvir histórias que jamais saberia se estivesse transitando só, assim como de imaginar a vida de quem está no mesmo barco que eu ainda que por instantes. Depois de assistir “Tudo em todo lugar ao mesmo tempo”, esse exercício ficou ainda mais divertido, uma vez que, a qualquer momento, um estranho pode, com um simples comando no rosto (quem sabe um sorriso), abrir uma dimensão que me fará gostar ainda mais de Juiz de Fora.

Morar, aqui, por outro lado, também é triste. São nítidos, até para os olhos menos sensíveis, os estragos que estratégias equivocadas ou inexistentes, adotadas ao longo dos anos, e agravadas pelo despreparo coletivo de entender que não dá mais para fazer as coisas que sempre fizemos, estão produzindo em todos e, principalmente, sobre os menos privilegiados, quer seja pela cor da pele, do gênero, da classe social. O abismo só aumenta. Ricos cada vez mais ricos. Pobres cada vez mais pobres. Nossa cidade pode ser diferente e será. Acredito.

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Para que isso se dê, porém, é preciso que a gente pare de falar mal dela e se comprometa verdadeiramente e cada vez mais com o que acontece de ruim por aqui. Se não está bom, só a gente que mora, usa ou gosta da cidade pode consertar. Cada um com sua habilidade, potencialidade, experiência de vida, independente da idade, do status social, do nível de erudição, da região onde reside. Precisamos mudar o discurso ultrapassado da Princesinha de Minas, da Manchester Mineira. Valores da monarquia e da Revolução Industrial não fazem mais sentido algum, sobretudo para a juventude do Terceiro Milênio.

Em qualquer dimensão do multiverso imaginário ou factível, o amor nos salva, incluindo aquele que devotamos ao lugar que sentimos pertencer.

Dias atrás, tive o privilégio de entrevistar a futurista Rosa Alegria, pioneira em estudos de futuro no Brasil, e uma das profissionais mais conceituadas da América Latina, para o caderno especial da Tribuna de Minas sobre o aniversário da cidade. Rosa tocou em um ponto crucial que me levou, inclusive a dar o título do filme a esta coluna, porque, tanto na ficção, quanto na vida real, o maior inimigo, seja no âmbito coletivo ou individual, é a desesperança provocada pelo descrédito no futuro. Quando ela recai sobre as novas gerações então, é catástrofe anunciada.

Porém, se a vida imita a arte (e vice-versa), não há motivo para pânico. O antídoto contra esse mal está bem ao nosso alcance. Em qualquer dimensão do multiverso imaginário ou factível, o amor nos salva, incluindo aquele que devotamos ao lugar que sentimos pertencer.

Te amo, minha Juiz de Fora. Gratidão por tudo que representa viver em você.

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