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Privatizando lucros e socializando prejuízos

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Há pouco mais de um mês o noticiário foi tomado pela declaração das Lojas Americanas da existência de uma dívida bilionária que coloca em dúvida o futuro da companhia. O anúncio traz uma série de questionamentos e levanta muitas discussões relativas ao mercado financeiro, responsabilidades de administradores e sócios de grandes sociedades empresárias e, por que não, sobre o próprio sistema capitalista.

Poucas semanas depois da avassaladora notícia, as Lojas Americanas entraram com pedidos de suspensão de execução de dívidas de modo a antecipar efeitos de um pedido de recuperação judicial que será manejado posteriormente.

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Como já dito, muitas são as discussões que esse caso abre e ainda se falará dele por longos anos. Como se chegou a esse patamar de dívida sem que nenhum órgão de controle percebesse? Houve omissão de informações? Os investidores terão que se responsabilizar por algo? Como ficarão os direitos dos credores, dos trabalhadores da ativa? Muitos são os pontos que se precisará debater.

Mas o que se quer refletir aqui neste espaço é o anúncio feito por um dos maiores credores das Lojas Americanas. O Banco Bradesco, que é o segundo maior banco privado do Brasil, transferiu seu crédito de R$ 1,8 bilhão para a União, através da redução no valor devido em impostos, o que na prática significa dizer que irá deixar o contribuinte brasileiro pagar pela transferência. Trocando em miúdos. Dos valores que o Bradesco tem a receber das Lojas Americanas, o montante de R$ 1,8 bilhão ele não irá cobrar, mas irá abater tal numerário no imposto que teria a pagar para a União, que ficará sem receber este valor.

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O banco usou uma estratégia contábil conhecida como “receita cessante” para realizar esta “transferência” de dívida. A Resolução nº 2682/1999 do Banco Central, criada durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, possibilita esse tipo de negócio e transfere os riscos para o Estado. É, na prática, uma renúncia fiscal do Executivo, ou seja, a União assume para si os prejuízos decorrentes de um não pagamento de dívidas de natureza estritamente privada.

O que chama a atenção é que existe este mecanismo, em que o Estado assume os riscos de um prejuízo decorrente de um insucesso da atividade empresária, mas não há qualquer previsão de algo semelhante quando se tem grandes lucros nas empresas. Nas situações em que a empresa está atingindo sua principal finalidade, que é a aferição de lucros, há apenas o pagamento dos tributos correspondentes, mas não há nenhum tipo de socialização dos haveres em que o Estado ganhe vantagens pela alta lucratividade, mas em caso de prejuízos, o risco é partilhado. Esta perece ser uma lógica bastante perversa do sistema capitalista.

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E não apenas em relação ao Estado esse fato ocorre. Se a empresa está lucrativa, salvo em situações específicas de programa de participação de lucros, pouco se vê os sócios dividindo o êxito com seus empregados de forma espontânea. Mas se o negócio não está bom e se faz um pedido de recuperação judicial, por exemplo, logo as empresas buscam negociar deságio com os empregados nas verbas que não receberam. Esta é a lógica que estamos vendo ocorrer: privatização de lucros e socialização de prejuízos. Que possamos refletir e buscar mudar esta cultura.

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