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Regime de bens dos septuagenários

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Há duas semanas, o Supremo Tribunal Federal reconheceu a existência de repercussão geral a uma questão há décadas debatida entre os juristas, qual seja, a incidência do regime da separação total obrigatória de bens às pessoas que contraem casamento e possuem, na data da habilitação, mais de 70 anos de idade, consoante determina o Código Civil brasileiro.

O casamento pressupõe comunhão plena de vida, sendo essa comunhão não apenas pessoal, mas também patrimonial, afinal, os contraentes se propõem a partilhar a vida. Em regra, os nubentes, ao habilitarem para o casamento, podem dispor previamente sobre as relações patrimoniais que terão entre si e com terceiros. Entretanto, tal não ocorre diante de situações pontuais, dentre elas a dos septuagenários que pretendem se casar (até 2010 essa regra existia para maiores de 60 anos). A eles se impõe o regime da separação total obrigatória de bens, sem qualquer possibilidade de disporem de forma diversa.

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Os fundamentos para a obrigatoriedade em questão cingem-se, basicamente, à alegação de vulnerabilidade do idoso e de cobiça de quem pretende o matrimônio por interesse meramente patrimonial – o famoso “golpe do baú”.

Entretanto, a restrição imposta demonstra autoritarismo do legislador, invadindo esfera de direitos individuais, não podendo a idade ser balizadora de restrição de liberdade e do poder de decisão de uma pessoa capaz civilmente. Como ponderado por Pietro Perlingieri, deve-se desvincular a avaliação dos atos e da atividade da pessoa da sua idade; o Estatuto do Idoso garante a este o respeito, a dignidade e a liberdade, como valores intrínsecos da pessoa humana. A trajetória de existência a ser traçada por uma pessoa é sua exclusiva decisão, sendo inerente à sua dignidade, pelo que apenas deve sofrer intervenção do Estado se estiver presente a incapacidade.

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E mais. Não se pode perder de vista que a expectativa de vida no Brasil aumentou sobremaneira e o envelhecimento ocorre com maior qualidade física e psicológica. De acordo com dados recentes do IBGE, aproximadamente 15% da população residente no Brasil em 2021 é idosa. Nos últimos nove anos, o contingente de idosos residentes no Brasil aumentou quase 40%. A projeção é de que até 2060 o número de idosos no Brasil corresponderá a um quarto da população*. Um olhar mais acurado e menos preconceituoso ao idoso é urgente e necessário. O espaço individual do idoso deve ser preservado.

A discussão sobre a constitucionalidade do regime de bens imposto aos septuagenários tardou, mas finalmente temos a oportunidade de corrigir um erro. Aguardando ansiosamente a decisão a ser proferida no Tema 1236 do Supremo Tribunal Federal e que seja de forma a estar conectada com os princípios constitucionais que lastreiam o Direito de Família e a formação da entidade familiar: dignidade, liberdade, autonomia e afeto.
*Dados fornecidos pela Agência Brasil

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