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Direito, solidariedade e perdão

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A coluna de hoje é uma homenagem a Desmond Tutu e ao professor Leandro Oliveira (UFJF), dois exemplos de humanismo que nos deixaram nos últimos dias de 2021

Enfim, o fim do interminável ano de 2021. Algumas boas notícias, como a resistência da ciência diante do negacionismo: ainda há quem olhe para cima. Por outro lado, a democracia, diminuída nas miudezas da política do “toma lá, dá cá”, enfrenta momento difícil e não raro, é verdade. O cenário nos convida a fazer algumas reflexões. Para tanto, tentarei organizar essas ponderações a partir de três temas: direito, solidariedade e perdão.

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O Direito é a alternativa possível que a humanidade elegeu contra força bruta. Sem intenção de dogmatizar, o direito é, em certa medida, o consenso sobreposto das concepções de vida boa de vários indivíduos, reunidas em um ou mais documentos políticos/jurídicos que vinculam todos. E por que vinculam? Essa relação política/jurídica acontece por haver incalculáveis projetos diferentes de vida e como não é possível conciliá-los tão somente pelo sentimento de cooperação, todos abrem mão de parcela de seu interesse e liberdade para obter estabilidade e organização social mínima. Por exemplo, a liberdade de um indivíduo expressar suas ideias é limitada (em princípio) pela honra de terceiros.

A solidariedade é princípio norteador das relações sociais que, mesmo repleta de contrastes e divergências, permitem pessoas livres e iguais se organizarem a partir de normas políticas e jurídicas comuns. Nesse contexto, as liberdades são responsáveis, a igualdade respeita as diferenças e a solidariedade nos convoca a exercer humanidade e cidadania. Exemplificando: se não quero vacinar, coloco em risco a coletividade e diminuo o alcance das políticas de saúde para combater a pandemia. No limite, ninguém pode ser obrigado a vacinar, mas em contrapartida precisa respeitar as restrições impostas pelo Estado (consenso sobreposto), sobretudo em decisões técnicas.

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Resta-nos, ainda, falar sobre o perdão. Usaremos, para tanto, sugestões de uma das maiores mentes dos séculos XX e XXI, Desmond Tutu. Nobel da paz e presidente da Comissão da Reconciliação e Verdade, promoveu a integração racial na África do Sul, colocando ofensores e ofendidos frente a frente, dando o poder do perdão às pessoas, experiência única quando se fala em reparação de violações de Direitos Humanos.

Em obra escrita com Mpho Tutu, Desmond propõe a ciência do perdão, aqui resumida nas seguintes reflexões: (1) o perdão é a única forma de costurar os “rasgos” na sociedade, pois somos dependentes uns dos outros. Então por que tratar o outro como sendo menos do que humano? (2) existe livre arbítrio para perdoar, mas não perdoar leva à amargura, ao ódio, à vingança etc.; (3) todo mundo erra, quando escolhemos perdoar reconhecemos que somos imperfeitos e humanos; (4) perdoar não significa esquecer, negar o mal causado, mas sim se lembrar do ocorrido e permanecer em paz consigo; (5) o perdão não é fácil, exige trabalho duro e uma disposição consistente. É um convite para encontrar a liberdade e a paz. Exige prática, honestidade, uma mente aberta e disposição, (6) O perdão é a reparação da conexão que foi perdida, é escolher o amor ao invés da dor e do isolamento. (7) Não há ato que não possa ser perdoado e alguém que não possa ser redimido. O perdão significa compreender que todos somos bons, mas também imperfeitos e que, por isso, estamos sujeitos a sermos vítimas ou agressores; (8) não perdoar é rejeitar nossa humanidade comum. No entanto, o ciclo do perdão lhe confere o direito de manter ou não a relação. O perdão é, antes de tudo, sua declaração de liberdade frente ao julgo do seu agressor.

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Que em 2022 possamos nos reconectar enquanto sociedade e país através do perdão, resgatando a humanidade aparentemente perdida, movidos pelo vínculo de solidariedade concretizado no direito. Não deixem de olhar para cima. Já dizia o genial Quintana: “tristes os caminhos, se não fora a presença distante das estrelas”.

 

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