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Lagom e polarização: olhando para além dos extremos

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Lagom é uma palavra de origem sueca que numa tradução simples significa “suficiente” ou “medida certa”. Lendo sobre essa ideia de bom senso na obra “lagom: a arte sueca para uma vida equilibrada” de Linnea Dunne, resolvi escrever sobre algo que relutei por algum tempo escrever: a falsa percepção política de esquerda e direita no Brasil e sua consequente “polarização jabuticaba”. Isso é perceptível, por exemplo, quando se nota brasileiros em manifestações públicas – legítimas – usando bandeiras americanas e cartazes pró Donald Trump. Ora, não há no Brasil uma clara noção e distinção entre republicanos e democratas tal como temos por lá. Tal percepção fica ainda mais evidente quando os defensores tupiniquins de Trump pensam que a vitória de Joe Biden significa a ascensão de um governo comunista na América do norte. O que se pode dizer de maneira tranquila é que essas percepções são ruins para conservadores, progressistas e, por fim, para o país, pois a arena política se torna um ambiente hostil aos pensamentos diferentes, semeando mais ódio e distanciamento social do que estima e tolerância. Pior, no fim, as pessoas nem sabem pelo que e por quê estão deliberando politicamente, transformando a política em arena meramente ideológica e quase sempre sem propósito, uma vez que poucos entendem os argumento de posição ideológica/política na arena pública.

Como encontrar esse meio termo? A medida certa?

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Tentarei pontuar algumas questões fundamentais que são preliminares ao que denomino aqui de falsa polarização. Esquerda, direita, liberais, conservadores e progressistas são denominações comuns nos debates políticos e na maioria das vezes mal empregadas. Lembro-me, no ponto, de, no último debate à Prefeitura de Juiz de Fora, um dos candidatos explicar ao outro que o Partido dos Trabalhadores e o Partido Socialista Brasileiro são mais próximos do que ele supunha, deixando em evidência a limitação de muitas pessoas de compreenderem essa dinâmica, inclusive um candidato forte ao Poder Executivo local (só mencionei o fato por que o candidato usou na ocasião argumento partidário). Essa falsa e, por vezes, má intencionada polarização restringi o debate político e só favorece os que preferem armas em detrimento dos palavras e guerras no lugar dos debates.
Polarização política ou ideológica, em breves palavras, significa que as pessoas se dividem em posições radicalmente opostas. Primeira constatação: todos os lados (políticos ou morais) possuem extremistas e nenhum extremismo é saudável para a política e para a vida de modo geral. Lagom se lembram? A vida boa é aquela onde toda e qualquer coisa ou situação é praticada em sua medida certa, no meio termo ou de modo suficiente. Portanto, nenhum extremismo é bom!

Compreender o significado de esquerda e direita, como bem lembra Norberto Bobbio, um dos maiores, nos remete à revolução francesa: a direita do Presidente da Assembleia se sentava o grupo parlamentar tradicionalmente constituído por conservadores. Por outro lado, à sua esquerda, sentava-se partidários da revolução socialista.

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Assim, esquerda e direita passam a significar programas contrapostos com relação à ação política, com considerável recorte econômico e com relação ao papel do Estado e da sociedade. Isso é o suficiente para transformar direita e esquerda em uma distinção maniqueísta? Claro que não! Porém, infelizmente, essa é a distinção nutrida pela política brasileira (não só) e quem perde somos nós, pois os projetos se complementam, não se excluem. Interessa sempre ao mau político a polarização extrema, já que assim pode vencer uma eleição sem apresentar projetos e participar de debates, apenas nutrindo ódio a algo que as pessoas não conhecem e por isso se torna fácil odiar. Esquerda e direita continuam a servir como pontos de referência, são pontos de partida, não um fim em si!

Você defende o fim das desigualdades? Você entende que as pessoas merecem iguais oportunidades? Que tal um sistema de saúde universal e gratuito? Talvez igualdade de gênero, de identidades e racial, preservando as subjetividades?

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Por outro lado você pode acreditar que a vida em sociedade reproduz a vida natural, com sua ferocidade, hierarquia e eficiência. Que na “corrida da vida” cada um corre com seu próprio par de tênis, e que se não chegar em primeiro é sua posição natural ficar para trás. Daí resta submissão à vontade do destino, mesmo sabendo que você estava descalço, desnutrido, sem uma noite de sono e ter “corrido” depois de pegar duas conduções por duas horas até o local da corrida.

É preciso, portanto, superar essas barreiras imaginárias. A liberdade de expressão pressupõe acesso à educação! Não há mercado livre e competitivo (competição exige lealdade) quando de um lado dessa luta há famintos e despossuídos. As tão caras liberdades só são possíveis com a igualdade material entre os seres humanos, o resto é privilégio!

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Portanto, entre bem e mal, escuridão e luz, o preto e o branco, não existe só penumbra e tons escurecidos, mas sim um arco-íris de possibilidades políticas e morais, que no fim se nutrem umas das outras, promovendo o propósito da política e das ideias: a vida boa! Lagom!

PS: se você ainda tem alguma dúvida sobre se o caminho do meio termo é o melhor, pesquise aí o índice de desenvolvimento humano e de expectativa de vida na Suécia!

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