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‘O legado de Júpiter’ decepciona, mas pode melhorar (e torcemos por isso)

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Oi, gente.

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“O legado de Júpiter” chegou à Netflix com suuuuuper-hiperexpectativas positivas, afinal o serviço de streaming tem acertado nas adaptações de HQs como “The Umbrella Academy”, e os quadrinhos de Mark Millar e Frank Quitely estão na lista de coisas mais legais lançadas na década passada. Mas, porém, todavia e todos os entretantos possíveis, havia uma parada que preocupava: como assim fazer uma série com temporadas de uma HQ que era uma minissérie e, por isso, teve apenas dez edições? Ok, também havia um prelúdio com 12 edições, mas mesmo assim faltaria material para uma série que imaginamos planejada para ter três ou quatro ou cinco temporadas.

Aí veio o medo. Será que teríamos no streaming o mesmo problema que houve com o “O hobbit” no cinema, em que Peter Jackson pegou um livro fininho e transformou uma história que renderia apenas um filme em nada menos que três?

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A resposta, infelizmente, é “sim”. Toda a expectativa positiva foi pelo ralo, e podemos afirmar que a primeira temporada de “O legado de Júpiter” é uma decepção colossal. História lenta, enfadonha, que praticamente não saiu do lugar, sem um décimo do dinamismo da obra original. Para quem leu os quadrinhos, ficou a impressão de que enrolaram e esticaram a história o máximo que puderam por haver tão pouco material com que trabalhar, para somente no segundo ano entrarem de vez nas tramas da HQ.

Antes de explicar por que não gostamos da primeira temporada, segue o tradicional aviso: a partir daqui, teremos spoilers tanto das HQs quanto da série, ok?

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SPOILERS.

SPOILERS.

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SPOILERS.

Isto posto, vamos começar pelos quadrinhos. A minissérie de Millar e Quitely trabalhava três pontos: um remete a “O Reino do Amanhã”, em que os heróis mais velhos precisam lidar com uma geração que não tem o mesmo senso de responsabilidade que eles; a dificuldade dos filhos lidarem com o legado dos pais, de seguirem seus passos, e a dificuldade dos pais que não entendem que a prole tem outra perspectiva de mundo; e o que acontece quando os super-heróis meio que se tornam os vilões da história quando decidem tomar as rédeas da política, economia e tudo mais.

Pois o roteirista e o ilustrador nascidos na Escócia conseguiram matar todas essas perguntas em apenas dez capítulos com uma trama dinâmica, ágil, plot twists que fazem o leitor querer ler tudo numa enfiada só. Mark Millar brilha com roteiros e diálogos que não perdem tempo com firulas, e Frank Quitely é aquele desenhista que consegue deixar interessante qualquer HQ ruim, imagine quando tem um bom material para se divertir.

“O legado de Júpiter” vai direto ao ponto no papel do início ao fim. Exemplos? O flashback que mostra como Sheldon Sampson (o Utópico) e amigos chegaram à ilha é mostrado nas seis páginas iniciais da primeira edição, e mais cinco no quarto capítulo – e só. As desavenças entre Sheldon e seu irmão Walter (um defende que os super-heróis devem apenas proteger o povo das grandes ameaças, o outro acha que está na hora de assumirem as rédeas de um país em crise) já aparecem na primeira batalha, e a edição dois deixa claro que o Onda Cerebral está tramando alguma coisa.

A terceira edição é puro “Game of Thrones” e entrega o grande plot twist da minissérie, com Utópico e sua esposa, Lady Liberdade, assassinados quando Walter convence o filho dos dois, Brandon, e outros heróis mais jovens a matarem o casal e assumirem o controle dos Estados Unidos, com resultados catastróficos.

“O círculo de Júpiter”, por sua vez, se passa no final dos anos 50 e início dos anos 60 e mostra alguns eventos citados na minissérie original. Além de expor que as desavenças entre Walter e Sheldon já duravam décadas, o prelúdio deixa claro que a União da Justiça não era nenhum “Superamigos” e, principalmente, o que levou a um dos integrantes do sexteto original de heróis, Skyfox, a se tornar “o maior vilão do mundo”.

Pois bem. É complicado não se deixar contaminar pela adaptação quando se conhece o original, mas “O legado de Júpiter” seria ruim mesmo se não tivesse lido uma página sequer dos quadrinhos ou sequer soubesse que se tratava de uma adaptação da HQ. O grande problema não é o “ah, essa não é a revista que eu li”, mas o fato de que havia um material fácil de se transpor para a televisão, mas resolveram tomar decisões totalmente equivocadas.

Para começar, “O legado de Júpiter” poderia imitar a HQ e ser apenas uma minissérie, em que 12 capítulos – se muito – resolveriam a história. Bastava um pequeno flashback mostrando como chegaram à ilha e pular para os dias atuais, intercalando a trama com o que foi mostrado no prelúdio. A série seria muito mais ágil e empolgante.

Porém, a produção é cheia de “barrigas” que inflam a trama de forma artificial. O flashback se estica até se tornar absolutamente insuportável, cheio de conflitos vazios e deixando os personagens chatos até criar uma hérnia emocional no público. Nos dias atuais, toda a discussão sobre legado, heróis que se preocupam mais com a imagem e seu papel, mal aparece. Perde-se um tempo fenomenal discutindo o tal Código, personagens aparecem e somem do nada, ninguém tem um desenvolvimento decente e é impossível ter alguma empatia por quem quer que seja. Por fim, parece que a série tem altas restrições orçamentárias, pois nenhuma das poucas cenas de luta empolga, e os efeitos especiais parecem tirados de uma série ruim do Arrowverso.

A impressão que fica é que os produtores, ao optarem fazer da minissérie de quadrinhos uma série com várias temporadas, inventaram de fazer uma longuíssima introdução para a adaptação. Essa impressão torna-se quase certeza nos minutos finais, quando alguns flashbacks revelam que o Onda Cerebral tem mexido os pauzinhos para conspirar contra o Utópico, indicando que a segunda temporada, enfim, vai aproveitar o material dos quadrinhos.

Depois de oito longos e tediosos episódios, “O legado de Júpiter” deixou a sensação de que estamos vendo o mesmo erro cometido em “O hobbit”, desta vez na televisão. Esperamos que, a partir de agora, a série se inspire no que os quadrinhos têm de melhor em termos de narrativa, sem se preocupar com uma transcrição literal da obra – o que nunca quisemos e sabemos ser impossível. Uma história bem contada já nos deixaria mais que felizes.

Vida longa e próspera. E obrigado pelos peixes.

(Assim que terminar a coluna, aproveite e vá seguir nossa playlist, tem no Spotify e Deezer. Só tem coysa phyna)

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