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Todas as cores dos quadrinhos LGBTQ+ made in Brazil

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Oi, gente.

A danada dessa pandemia de coronavírus está igual ao Jimmy Cliff de 30 anos atrás: descobriu o Brasil e resolveu morar por aqui,  aproveitando-se da irresponsabilidade da maioria dos políticos e parte considerável do povo, que não levam a Covid-19 a sério mesmo com mais de mil mortes registradas por dia, sem contar a subnotificação.

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Além de alongar ad aeternum o isolamento de quem tem consciência dos riscos da doença, a pandemia segue a impedir a realização presencial de vários eventos. É o caso da POC CON, feira de quadrinhos e artes gráficas protagonizada por artistas LGBTQ+ que tinha sua segunda edição agendada para este junho, dentro das atividades do Mês da Visibilidade LGBTQ+. Sem poder reunir as pessoas no tradicional olho no olho, a organização do evento não ficou a lamentar o destino e deu início à sua edição virtual, a POC CON em Casa, no último sábado (13), prosseguindo até o próximo dia 27 com várias atividades. Dá para conferir toda a programação no site poccon.com.br.

Um dos baratos da POC CON em Casa é a Gibiteca Digital, em que dezenas de artistas liberaram HQs e fanzines no formato PDF para download gratuito. É claro que o ideal seria adquirir por meio de dinheiro os trabalhos dos artistas – quem puder que dê aquele apoio -, mas imagino que baixar e divulgar a arte de toda essa gente que tá ralando também vale. Não paga as contas, mas vai que o amigo do peixeiro que entregou o bacalhau na casa da tia da ex-namorada da sua prima leia sua postagem, se interesse e compre algum gibi.

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Como o tempo é curto e o espaço, pequeno, lemos quatro das HQs disponíveis na Gibiteca Digital. Uma delas foi “Bendita Cura – Vol. 1”, de Mário César, um dos organizadores da Feira, e é uma das coisas mais lindas e tristes que li nos últimos tempos. O quadrinho foi lançado em 2018 e mostra a mais que triste infância e adolescência de Acácio: filho de um casal conservador e preconceituoso dos anos 70, ele sofre o diabo quando começa a deixar claro que prefere as brincadeiras consideradas “de meninas”, o que faz seus pais se revoltarem e recusarem “ter um viado” em casa.

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As pouco mais de 120 páginas da HQ mostram o garoto obrigado a passar por várias situações que já ouvimos ou lemos por aí. “Tratamentos médicos” que prometem uma “cura” para a “doença”, surras por partes dos pais – talvez os momentos mais angustiantes da história -, “incentivos” para “virar homem” (as visitas a prostíbulos, por exemplo), bullying e agressões na escola…

Para o primeiro volume de “Bendita Cura”, Mário César usa apenas o azul e rosa na colorização de personagens e cenários, deixando claro como o mundo era – e ainda é, muitas vezes – tão bidimensional e fechado para as outras escolhas que podemos ter. Outra HQ do artista na Gibiteca Digital é “Ciranda da solidão”, e no site masquemario.net é possível comprar os quadrinhos do autor.

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Já “Pillow talks” tem roteiro e arte de Sasyk, que no seu site (sasyk.com.br) se define assim: “Sasyk ama humanos e escreve sobre melancolia, amor e, acima de tudo, tragédias. Afinal, toda história é uma tragédia.” E não há melhor forma de se explicar o amor entre os jovens Dezai e Nico, unidos e em colisão ao se envolverem numa relação marcada por aproximações, distâncias, provocações e confissões.

Os desenhos são inspirados no estilo japonês, e o texto de Sasyk tem uma poesia e lirismo que raramente se encontra nos quadrinhos. São 96 páginas para se ler absorvendo casa frase e ilustração.

Também lemos “Black Science”, de Mary Cagnin, que ainda deixou em 0800 na Gibiteca Digital “Vidas imperfeitas” e “Bittersweet”. O projeto foi o primeiro da artista – responsável por roteiro e arte – na ficção científica, com uma história que se passa no século XXII.

A protagonista é Neesrin Ubuntu, da Força Aérea Espacial (FAE), responsável por uma missão para descobrir um planeta habitável num lugar do universo que consegue ser mais longe que Uberlândia. O problema é que o planeta para onde ela e seus comandados são enviados tem seus mistérios, e a própria tripulação também tem questões mal resolvidas.

A história me lembrou, em alguns momentos, tanto “Interestelar” quanto “Prometheus” e “Covenant”, os dois últimos filmes da franquia “Alien” – mas só as coisas boas da dupla de longas de Ridley Scott.

Ah, a lojinha virtual da artista (marycagninstore.com) tem muita coisa legal à venda, vale conferir.

Nossa última leitura da POC CON em Casa é “As Empoderadas”, de Germana Viana, uma das HQs de super-heroínas mais legais que li. A série em cinco edições venceu a categoria Webquadrinhos da edição 2017 do Troféu HQMix e mostra que as mulheres têm o poder, sim senhor, e não vão dar mole pra ninguém.

As protagonistas são uma mulher casada, com filhos e que ficou desempregada quando engravidou; uma nerd forçada a esconder a namorada da família; e uma advogada quarentona e baladeira. E todas elas são pessoas comuns, com seus quilinhos a mais, um nariz igual ao da Rossy de Palma… nada a ver com as heroínas bundudas e peitudas dos quadrinhos da Marvel, DC Comics ou Image. A diferença é que elas, assim como um monte de outras pessoas, ganharam poderes quando um inexplicável fenômeno astronômico atingiu a Terra.

As três resolvem usar seus poderes para ajudar quem precisa de proteção, em especial as mulheres, e logo se veem no meio de um mistério quando outras pessoas com poderes desaparecem sem explicação. “As Empoderadas” é o que o título propõe: mulheres que se unem para mostrar que o preconceito, o machismo, vencem apenas enquanto aqueles que estão acostumados a vencer continuam ganhando, que basta apenas unir e mostrar força para virar o jogo. O poder já está ali, basta ter confiança e botar os machistas e misóginos pra correr.

Germana Viana também disponibilizou na Gibiteca Digital três HQs curtas dos “Catecismos de Mama Jellybean”, e quem quiser adquirir mais material da artista pode fazer aquela visita sagaz a germana.iluria.com.

Além do quarteto, a Gibiteca Digital disponibiliza na gratuidade quadrinhos e fanzines de artistas como Renata Nolasco, Marco ByM, Aline Lemos, Flávia Borges, Yuri Amaral, Kael Vitorelo, Monaramis, Renata C B LZZ, Gustavo Inafuku, Lino Arruda e Roh, o Orc, entre tantos outros. Basta baixar e ler no PC, celular (meio complicado pela telinha) ou no tablet (o mais recomendado). Da minha parte, já estou com minha lista de leitura preparada.

Vida longa e próspera. E obrigado pelos peixes.

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