Oi, gente.
Sabe o #ThrowbackThursday (ou simplesmente #tbt), aquela hashtag que a galera usa nas quintas-feiras para relembrar momentos legais? Eu mesmo nunca usei, porque toda vez que penso comigo “vai lá e faz” o que acontece? Esqueço de postar, aí já passou da meia-noite, digo “desgraça” e prometo que na próxima semana vai. Igual aos saquinhos de chá que sempre me cobro para deixar na redação e salvar o dia quando o café acabar – hoje mesmo (sexta-feira), quando escrevo esta coluna, fiz o favor de esquecer, mas tinha café, aleluia.
Aliás, tem um povo que usa o #tbt fora de contexto, tipo numa segunda-feira à tarde, mas cada um sabe do seu. O lance aqui é outro. São os #ThrowbackThursday emocionais que podemos ter a qualquer momento, e calhou que o mais recente foi justamente numa… quinta-feira, quando fiz uma dobradinha cinematográfica: “Yesterday”, o mais recente filme do diretor Danny Boyle, e o show em comemoração aos 40 anos do The Cure.
Não poderia ter feito escolha melhor. Cheguei em casa tarde e cansado, Imperador Django já pensava em viver da caça de pequenos animais distraídos, mas a maratona valeu a pena, porque a gente (eu) riu, se emocionou, quase chorou, gritou mentalmente “fala ‘vem comigo’, seu bastardo!”, cantou junto, quis dançar, abraçar desconhecidos, essas coisas que só a arte faz conosco.
Sobre “Yesterday”. O filme é uma comédia romântica em que um apagão global apaga da memória de todo mundo a existência dos Beatles, menos de um músico fracassado que foi atropelado justamente nessa hora. Daí que ele corre contra o tempo para registrar o que lembra das músicas do grupo, grava algumas, é descoberto, faz sucesso e se torna o Michelangelo do rock e do pop. E meio que paga o preço da fama, tem que encarar uma indústria fonográfica caricata, departamentos de marketing capazes de estragar o que apenas propõe ser um punhado de ótimas canções. Como é uma comédia romântica, tem ainda a relação entre o protagonista e a menina toda apaixonadinha por ele.
O grande barato do filme, porém, está nas canções dos Beatles. Como é dito em algum momento da história, o mundo seria muito pior sem o quarteto de Liverpool. Isso fica evidente quando os clássicos de John, Paul, George e Ringo ganham vida, são ouvidos pela primeira vez por quem sequer havia nascido quando “Eleanor Rigby” foi gravada – no caso do longa, deveria ter sido gravada. É engraçado perceber como “Hey Jude”, entre outras, é percebida de outra forma sem ter aquela chancela de “clássico” que ela carrega para as novas gerações, ou ganha ares de um grito desesperado de socorro em “Help!”. “Ob-La-Di, Ob-La-Da” emociona por mostrar como os Beatles foram e continuam sendo importantes para a música, para formar novas gerações de apaixonados pelo rock, pop ou seja lá qual gênero musical que a pessoa abraçar.
Sempre encarei os Beatles como a maior banda da história, claro, mas naquele esquema “ok, vou ouvir, né?, são clássicos, coisa e tal”, mas desde a última quinta-feira as músicas do Fab Four ganharam um significado, uma importância, que não existiam para mim. Sinto, hoje, viver em mundo melhor que o de semana passada, e que somos uns filhos da mãe privilegiados pelo privilégio de ouvir “Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band”, “Back in the U.S.S.R.”, “Let it be” e, claro, “Yesterday”.
Quanto ao The Cure, rolou o show realizado ano passado no Hyde Park, em Londres, para comemorar os 40 anos da banda. E com uma formação quase clássica, com o que chamo de “os Cure velho”, sendo que Robert Smith, claro, é um caso à parte. A voz continua a mesma na maioria das músicas; o cabelo, grisalho, mais do que nunca parece um ninho de pássaro bêbado; o olhar perdido, o sorriso que você não sabe se é de felicidade ou de psicose, também. E o senso de humor, óbvio: “Eu não posso falar até o pôr do sol, preciso guardar energias para não virar pó.”
O setlist é aquela coisa linda, começando com “Plainsong” e que se despede com “Killing an arab”, e no meio disso tudo tem “Boys don’t cry”, “Inbetween days”, “Lullaby”, “From the edge of deep green sea”, “Shake dog shake”, “Close to me”, “Friday I’m in love”, “Fascination Street”, “10:15 Saturday night”, “Jumping someone else’s train”, “A forest”… Você está no cinema, mas a vontade é cantar junto, bater palma, dançar; como não pode, cantamos baixinho, batemos os pés, às vezes chacoalhamos o corpo, e é o que dá.
O show, por si só, já seria suficiente para ficar feliz, mas há todas as lembranças do passado distante. Foi em 26 de janeiro de 1996, num Hollywood Rock que ainda tinha Smashing Pumpkins, White Zombie, Supergrass e Pato Fu, que assisti a meu único show do Cure, que retornou ao Brasil graças a um abaixo-assinado do fã-clube Catch a Cure.
Enfim, essa história foi citada por alto em fevereiro de 2017, numa coluna sobre a coletânea “Standing on a beach”, mas volto a ele por motivos especiais. Esse show do The Cure aconteceu onze dias após a morte da minha Vó Neném, e eu estava mal, muito mal mesmo. Fiquei uns bons dias pensando se deveria ir ou não, se isso me faria bem, mas no final das contas acabei indo. E foi um dia emocionante, com amigos que havia conhecido há poucos meses e que carrego comigo até hoje.
Assistir ao Cure na tela de cinema trouxe de volta todas essas lembranças, de como a música pode nos ajudar em momentos ruins. Aliás, de como ela, a música, pode fazer bem a qualquer momento, o quanto nos ajuda a passar o tempo, dar foco e inspiração no trabalho (sim, trabalho quase todo o tempo ouvindo música), fazer amigos, conhecer histórias, pessoas, lugares, saber que outros compartilham das mesmas emoções, animar o dia. Momentos assim ajudam a renovar nossa relação com a arte, e este foi o caso do #tbt emocional com Beatles e The Cure – que ouvi enquanto escrevia esta coluna.
Vida longa e próspera. E obrigado pelos peixes.
Faltou dizer que…
Já que o assunto é música, lembramos que nossa playlist segue firme e forte no Spotify. Pode procurar por “…E obrigado pelos peixes” e curtir quase 70 horas de música. E sim, tem Beatles e The Cure.