Fala Quem Sabe
Carnaval, uma paixão sem fim
Minhas paixões na área do lazer são samba e futebol, nesta ordem de preferência. Vivo o Carnaval o ano inteiro. Acabou um, já começamos a pensar no próximo, qual o enredo etc.
Grande parte da minha vida passei no Ladeira, talvez um dos menores bairros da cidade, mas sempre efervescente nas promoções sociais. E isto se deve na quase absoluta maioria à Escola de Samba Unidos do Ladeira. Agremiação nascida por iniciativa de um grupo de amigos, dentre eles, eu e o saudoso Raposa, que hoje dá nome à quadra da escola e à ponte sobre o Rio Paraibuna, na Rua Marechal Setembrino.
A Unidos do Ladeira surgiu como bloco de embalo, em 1976, desfilando na Rua Halfeld, local que era epicentro da festa de momo em Juiz de Fora, ao lado da Avenida Rio Branco que abrigava o desfile das escolas de samba, alguns blocos e a Banda Daki. A partir de 1979 tornou-se escola de samba, por determinação do antigo Departamento Autônomo de Turismo (DAT). Foi esse o ponto de partida para uma ascensão meteórica para se tornar uma das mais importantes e poderosas escolas de Juiz de Fora. Começou no terceiro grupo, foi para o segundo e num prazo de cinco anos estava entre as tradicionais escolas Turunas do Riachuelo, Feliz Lembrança, Real Grandeza, Partido Alto e Juventude Imperial.
Ganhamos vários títulos, com sambas e enredos que ficaram marcados entre os melhores já produzidos em nosso Carnaval. É a mais nova das escolas de samba, porém a detentora de maior número de títulos, são 17 ao todo. Infelizmente, nós que já tivemos o terceiro Carnaval do Brasil, considerado assim, por especialistas e mídia em geral, fomos perdendo espaço, prestígio, principalmente depois da retirada dos desfiles do seu mais tradicional palco, a Avenida Rio Branco. As escolas passaram a ter muitas dificuldades, de todas as ordens, incluindo aí falta de planejamento e ajuda do poder público, como se faz em outras localidades com carnavais famosos e atraentes. Talvez, a gota d’água tenha sido o deslocamento de datas dos desfiles, retirando-os dos dias oficiais do Carnaval.
Hoje, 20 de fevereiro, um domingo de Carnaval há alguns anos atrás, seria mais um dia de grande agitação e muito trabalho. Chegar cedo ao barracão do Ladeira, tomar café com a turma, conferir os últimos detalhes, entregar fantasias, finalizar e levar os carros alegóricos para a concentração. Um envolvimento de dezenas de pessoas. Uma procissão de alegorias pelas ruas de Juiz de Fora mostrando que nosso Carnaval ainda respirava. À noite/madrugada chegava com os desfiles na passarela e agitando a avenida. Mais trabalho, organizar as alas, posicionar os carros alegóricos, subir com os destaques. Motivar a bateria e conferir a ala das baianas, um xodó. O desfile era a realização de meses de trabalho de muita gente. Nosso sonho, sonhado na avenida, com a arquibancada de pé. Fim do desfile. Choro, risos e lágrimas se misturavam entre os componentes. Cada um deu seu melhor. Hora de organizar a saída dos carros novamente para o barracão. A volta da procissão no silêncio da madrugada. Assim terminava o domingo de Carnaval. Na terça-feira, tudo se repetia e o sonho voltava para a avenida. Nesta época de glória do nosso Carnaval trabalhava os últimos dez dias que antecediam a folia como nunca e de forma incansável. Mas valia a pena. A alegria de ver o Ladeira na avenida superava qualquer cansaço. Os títulos, os desfiles, os destaques, os sambas, compositores, os carros e alegorias são atualmente apenas saudades. O nosso Carnaval, hoje, resume-se aos blocos, como por exemplo, o Pintinho de Ouro oriundo da Unidos do Ladeira, que mantém a chama carnavalesca daquela turma que desfilou vários anos na escola.
A nossa esperança é termos o nosso Carnaval de volta de forma plena, com blocos, escolas, bandas. Ainda militando na Unidos do Ladeira tenho a certeza que vamos conseguir e voltaremos à folia trazendo o nosso eterno slogan “O Ladeira te ama”.
(Roberto Cândido da Silva, o Boizinho, é empresário do setor de construção civil, grande carnavalesco e leitor convidado)