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Nós os invisibilizamos

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Desde criança tenho problemas para aceitar a expressão morador de rua para definir aqueles que não têm moradia e passam o dia ao relento. Rua não é e nunca foi lugar de morar. Ao contrário, quando estamos na rua, é porque estamos fora de casa. Então, como se pode ser morador de rua? Questionava-me.

Hoje, adulto e jornalista, compreendo melhor a expressão, mas ainda acho difícil aceitá-la. Principalmente porque sabemos que, quando há redução de direitos sociais, existe o crescimento das condições que levam as pessoas para a situação de rua. O mais triste é pensar e constatar que, junto do aumento das pessoas sem residência, amplia também nossa alienação. A questão dos moradores de rua está tão entranhada no dia a dia que grande parte de nós já habituou-se a ela.

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Deparar-se com grupos de moradores de rua e sequer notá-los, faz parte do senso comum. Nós os invisibilizamos! Talvez essa seja uma estratégia nossa a fim de esquecermos o quão duros nos tornamos, o quanto de nossa humanidade já foi perdida.

Neste último fim de semana, um incêndio na Favela do Cimento tomou barracos na Avenida Radial Leste, em São Paulo. Um homem morreu e 200 pessoas ficaram desabrigadas. O episódio despertou o lado desumano de alguns indivíduos que circulavam de carro pela via. Eles promoveram um buzinaço para comemorar o fogo, fazendo-nos lembrar do higienismo do início do Século XX, que, entre os seus sentidos, havia o de higienizar a sociedade, “descartando” o que, na visão de alguns, não servia para a cidade.

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Toda essa história me fez pensar em Juiz de Fora. Recentemente, eu e a jornalista Sandra Zanella fizemos uma reportagem sobre a polêmica causada acerca da possível mudança do Núcleo do Cidadão de Rua e do Centro Pop (Centro de Referência Especializado para População em Situação de Rua) das ruas José Calil Ahouagi e Professor Oswaldo Veloso, no Centro, para um imóvel, na Avenida Brasil, entre os bairros Costa Carvalho e de Lourdes, na Zona Sudeste. Os dois equipamentos são destinados a adultos em situação de vulnerabilidade que vivem nas ruas.

A mudança dos atuais imóveis se daria porque ambos não têm mais condições de abrigar os cerca de cem usuários diários por questões estruturais e de segurança. Mas representantes de moradores dos dois bairros e também do Poço Rico e Aracy, na mesma região, além de escolas e entidades próximas ao novo endereço, não querem receber os equipamentos públicos, temendo aumento da violência. Esse é um problema que ninguém quer ter como vizinho.

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E, para resolvê-lo, não há soluções rápidas. É preciso, por parte do Poder Público, políticas, de longo prazo, que pensem na população de rua não apenas como algo que possa ser trocado de lugar. São necessárias ações que ofereçam apoio psicológico, profissionalização e encaminhamento para o mercado de trabalho. Não dá mais para somente tratar os efeitos, faz-se fundamental atacar as causas dos fatores que levam as pessoas para as ruas. Nessa perspectiva, olhar para o outro com mais empatia, se não faz a situação dele mudar de uma hora para outra, devolve-lhe um pouco de dignidade, que pode ser o pontapé para uma mudança de fato.

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