Os livros são algo que me encantam. Eles carregam um universo dentro de suas páginas. O mais engraçado é que, quanto mais velho e com marcas de uso, grifos, anotações e dedicatórias, mais aumenta meu encantamento. Sempre fico imaginando por quantas mãos eles passaram, quantas pessoas conseguiram afetar, quantos desejos foram capazes de florescer, quantas decisões ajudaram a ser tomadas, quantas identidades apoiaram a fomentar e quantas vidas contribuíram para modificar. Minha experiência com os livros começou muito cedo, não me lembro a idade. Mas eles sempre estiveram comigo. No início, eram as histórias infantis, os quadrinhos, a Coleção Vaga-lume. E, a partir daí, os grandes clássicos da literatura brasileira e mundial. Mas, devo ressaltar que os autores brasileiros são meus preferidos.
Foi na biblioteca do Instituto Estadual de Educação, conhecido como Escola Normal, que Machado de Assis, José de Alencar, Bernardo Guimarães e Aluísio de Azevedo se tornaram meus amigos. Sim, porque estabeleci com eles uma relação de intimidade. Eles me ensinaram muito sobre como a sociedade brasileira foi constituída, acerca das relações humanas e dos sentimentos. Praticamente, devorei todas as obras deles que estavam ao meu alcance nas prateleiras da biblioteca do IEE, que é um dos prédios mais imponentes de Juiz de Fora, no encontro da então Avenida Independência com a Avenida Getúlio Vargas. Até hoje, quando caminho por ali, me surpreendo com a beleza da edificação. Naquela época, na década de 1990, a biblioteca era no último andar, conhecido como “Castelinho”. Para chegar até lá, era preciso subir a escadaria de mármore branco e também se deparar com a beleza do Salão Nobre. Essas são lembranças que não se apagam! Daquela biblioteca, fui assíduo frequentador até deixar o colégio para ingressar na faculdade.
E por que estou lembrando disso agora? No último domingo, assisti, com atraso, ao filme “Fahrenheit 451”. A obra se passa em um futuro distópico, em que os bombeiros não apagam, mas, sim, ateiam fogo em livros, que são proibidos completamente, a não ser que sejam manuais de instrução. A história do filme, que é baseada em um livro de mesmo nome, do autor Ray Bradbury, faz a gente pensar no momento atual brasileiro, no qual a educação, os professores e os estudantes são vistos, por alguns, como ameaças. Que triste constatação essa, né? Assim, fiquei pensando: e se a situação se agravasse de tal maneira que os livros chegassem a ser proibidos como no filme?
As obras de Paulo Freire já têm sido atacadas. Inclusive, houve candidato à presidência que ameaçou entrar com um lança-chamas no MEC (Ministério da Educação) para arrancar Paulo Freire de lá. Voltando ao filme, temos ali uma narrativa que nos faz questionar sobre qual seria o destino de uma sociedade que, ao se fascinar pelos avanços da tecnologia, deixou os livros de lado.
Depois de assistir ao filme (ainda quero ler o livro), impossível não pensar numa mensagem de alerta. Fica impraticável não refletir sobre o que o Brasil e o mundo atravessam nesse limiar do Século XXI. Como ignorar a opressão ainda imposta nos muitos sistemas políticos atuais, na dominação imprimida sobre nós por meios complexos de mídia? O cenário de “Fahrenheit 451” é construído em base de uma verossimilhança assombrante e muito próxima do que vivemos. Assim, quero deixar aqui meu manifesto a favor dos livros. Que eles possam continuar sendo nossos arautos da boa-nova, do nosso conhecimento de mundo e de nós mesmos! Que nossa bandeira seja erguida contra a privação do indivíduo de sua capacidade de raciocinar, do seu posicionamento enquanto ser pensante e independentemente de qualquer tipo de governo. Desejo que cada criança, e até mesmo um adulto que pegar um livro pela primeira vez, possa descobrir o seu deslumbramento. Vida longa aos livros!!!!