Vocês sentem que, às vezes, as 24 horas do dia não são bastantes para o tanto de compromissos e projetos que temos que dar conta? A correria do dia a dia nos impõe uma série de atividades a serem realizadas e decisões a serem tomadas. Na maioria das vezes, tudo isso acaba sendo feito de forma automática e não é por nossa vontade própria. Se assim não fosse, seria muito difícil arcar com todas as responsabilidades que encontramos em nosso cotidiano. No final do dia, o que nos resta é uma sensação de exaustão e a certeza do toque do despertador para começar tudo outra vez, na manhã seguinte.
O celular e, principalmente, o WhatsApp contribuem, em demasia, para esse sentimento de opressão do tempo. Um tempo em que o expediente parece não ter fim, porque as barreiras que antes separavam o tempo livre do tempo de trabalho foram fragmentadas. Nem em casa estamos imunes! A qualquer hora, podemos ser acionados, e, a qualquer hora, o trabalho nos alcança. O mais intrigante dessa situação é que as pessoas não veem anormalidade nisso. Simplesmente, aceita-se. É como se estivéssemos, coletivamente, dopados. Repare que já estamos no mês de setembro, sendo que outro dia era janeiro. Como dizem: “o ano voou”. Nem deu para senti-lo passar!
Quando era criança, tinha a impressão de que o ano era muito maior, demorava para acabar, tinha mais “espaço” para caber os dias. O intervalo entre Páscoa, Dia das Crianças e Natal era imenso e me posicionava sobre os ciclos da vida. Agora, como adulto, minha percepção é de que meses e anos se emendam, formando um rodamoinho, que serve para nos tragar e nos perder de quem a gente era e de quem a gente é. E, com tanta coisa para fazer, ficamos cansados de nós mesmos, porque o esforço para sermos nós, com tudo aquilo que nos propomos, é pesado. Somos patrão e empregado no mesmo corpo, explorando a nossa força e sufocando nosso espírito.
E por que estou falando disso nesta coluna? Explico: na semana passada, precisei ler o livro “Sociedade do Cansaço”, do filósofo sul-coreano Byung-Chul Han, para uma disciplina da pós-graduação. Um livro pequeno, mas muito necessário para estes dias que se escorrem pelas nossas mãos sem que a gente perceba. Para Han, cada época possui epidemias próprias, como as doenças bacteriológicas e virais que marcaram o século 20 e, agora, as patologias neurais, como a depressão, definem o século 21.
Han usa o trabalho do sociólogo Alain Ehrenberg para dizer que o cansaço de ser quem somos surge da pressão para sempre sermos autênticos e produtivos, bem como da ideia de que nada é impossível e tudo só depende da força de vontade individual. Para o sul-coreano, o cansaço de si mesmo culmina numa autoexploração do indivíduo, que se entrega ao excesso de trabalho, mas com sentimento de liberdade.
O livro de Han tem quase 80 páginas e não consigo tocar em todas as questões apontadas no espaço desta coluna. Mas gostaria de destacar também que, para o filósofo, a falta de repouso empurra a civilização para a barbárie. Ele fala da importância do tédio para a criatividade. Algo que temos eliminado da vida cada vez mais preenchida por afazeres e estímulos simultâneos, como perguntar a seu filho como foi o dia na escola ao mesmo tempo em que responde ao seu chefe no trabalho pelo WhatsApp. Neste mundo regido pelo capitalismo, isso pode parecer vantagem, mas, no fundo, só prova que nossa caminhada, a cada dia, deixa-nos mais longe de nossa humanidade!