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Nem carrinho, nem boneca, nem videogame

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Querido Papai Noel,

Venho, por meio desta, solicitar ao senhor que não fique assustado com um pedido tão inusitado como o do menino Hector, morador da cidade de Arroio Grande, no Rio Grande do Sul, no Brasil. Imagino que, ao receber a cartinha dele, o senhor deve ter se perguntado se não era uma brincadeira de mau gosto. Mas, não, é pura verdade. É carne mesmo o que ele sonha em ganhar de presente de Natal.

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Infelizmente, senhor Noel, a situação aqui no Brasil é crítica, e o custo de vida tem castigado as pessoas mais pobres. Ter um prato de comida sobre a mesa, diariamente, tornou-se algo para privilegiados. Carne é artigo de luxo e, por isso, não se espante, velho Noel, que mais cartas com esse mesmo pedido cheguem para o senhor até o próximo dia 25, inclusive aqui de Juiz de Fora, de onde escrevo.

Nem carrinho, nem boneca, nem videogame. No Brasil, onde quase 20 milhões de pessoas afirmam que passam períodos de 24 horas sem ter o que comer, um pedaço de carne virou sonho de presente de Natal para os filhos de famílias que tiveram sua condição financeira arrasada pela constante crise política e econômica, agravada pela condução desastrosa da pandemia de Covid-19.

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O menino Hector, de 7 anos, assim como a maioria dos brasileiros, gosta muito de churrasco, sabe, Papai Noel? Até o senhor, que não é bobo (desculpe a intimidade), deve apreciar um bom corte assado e ainda se aproveitar do calor da churrasqueira para espantar o frio aí do Polo Norte. Mas, voltando ao caso do garoto, após passar meses de privação em casa, ele perguntou à mãe se eles poderiam assar uma carne no dia de Natal.

A resposta foi sincera. “Filho, não sei, pois as coisas estão muito difíceis. A carne aqui está muito cara mesmo”. Não se conformando com a justificativa da mãe, Hector pensou em uma solução: “Já sei. Vou fazer uma carta para o Papai Noel, e ele vai nos ajudar”, disse o garoto.

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“Papai Noel, meu sonho é ganhar uma carne para passar com a minha família, tenho 7 anos, muito obrigado, Papai Noel”, escreveu o menino, a lápis, com sua caligrafia de quem ainda está na fase de alfabetização.

A família de Hector, meu bom velhinho, não sei se ele contou, além dele, é formada por sua mãe, padrasto e três irmãos, e os recursos financeiros com os quais agora contam vêm dos bicos do padrasto e do trabalho da filha mais velha, que cuida de uma idosa.

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“A gente compra (carne), mas agora é miúdos, ossos, essas coisas mais baratas”, contou a mãe, em uma entrevista. Ela também afirma que a família nunca tinha passado necessidade. “Foi no último ano que a situação apertou mesmo”, disse.

E apertou de verdade, senhor Noel, para muita gente. Tanto que houve flagrantes de pessoas em filas quilométricas para conseguir ossos com retalhos de carne. Cenas incontestáveis de brasileiros lutando contra a fome.

A mãe alertou o filho de que, talvez, o senhor não atendesse o pedido, porque o preço da comida está alto demais, mas Hector disse para ela ficar “tranquila, pois o Papai Noel sempre ajudava todo mundo, porque ele era Deus”. Pois é, velho Noel, do jeito que as coisas vão para nós, brasileiros, só mesmo esperando uma intervenção divina para que a situação volte a melhorar. Desde já, agradeço por sua atenção! Pense com carinho no pedido de Hector, viu! Um bom Natal para o senhor e para todos!

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