Mesmo destinando parte considerável dos rendimentos da nossa labuta para os impostos, ainda pagamos pedágios por boas estradas, escola particular por uma educação de qualidade, plano de saúde para evitar surpresas desagradáveis e por aí vai, e quem não pode, fica sem. E parece que a onda vem flertando com o futebol. Agora, para ver seu time te dar alegrias, você tem que pagar, e não é o ingresso do jogo.
Me surpreendeu, a declaração de um comentarista esportivo em um programa da TV fechada num início de tarde desses. O companheiro clamava em bom tom que o amante de futebol que cobra título e contratação de bom jogador tem que ser sócio-torcedor. Nas redes sociais vejo com frequência a cobrança entre torcedores do mesmo time sobre a necessidade de atingir o topo do “torcedômetro”, ocupado hoje pelo Internacional lá dos Pampas, com mais de 130 mil sócios-torcedores com a mesma bandeira levantada pelo comentarista. O outro Bandeira, presidente do Flamengo, condicionou a contratação de um jogador de peso à meta de 80 mil sócios atingidos, isso para um clube que recebe R$110 milhões de cota de TV e estima R$ 90 milhões nos patrocínios do uniforme rubro-negro. Se boa parte desta fortuna se destina a dívidas antigas, caberá ao torcedor pagar pela má gestão e incompetências passadas? E se os dirigentes do seu time de coração não lhe passam segurança alguma, transparência, profissionalismo e respeito ao seu clube, você vai destinar alguma coisa e 90 centavos para os sujeitos tomarem conta?
E os benefícios dos programas de sócio? Ingresso sem fila, gestores competentes, espetáculo com conforto e segurança, o encontro com o ídolo nos treinos, visita ao clube de coração… deviam ser direitos do torcedor comum, que tem a paixão pelo clube no peito, sem exceções, principalmente aquele que divide o dinheiro do ingresso com o leite da família. Aquele amigo da geral, que não tem dinheiro para o plano de saúde, quanto mais para o programa de sócio-torcedor, está cada vez mais afastado e relegado como minoria nas arenas pós-copa, com seus blocos de arquibancadas sem alma e com preços de arrancar a alma.
Ainda fico com o rock dos anos 80 que dizia: “Há espaço pra todos, há um imenso vazio”.