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Exercício de vida

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Sempre fui avessa à academia de ginástica e, usando a minha preguiça como escudo, acabei levando uma vida absolutamente sedentária nos últimos 42 anos. Mas há alguns meses, meu organismo chiou feio. Resultados de exames laboratoriais mostraram o que o corpo já tentava me dizer há muito tempo: o colesterol estava nas alturas, a filtragem do sangue pelos rins ficou ameaçada e, para piorar as coisas, o ponteiro da balança havia disparado. Percebi que precisava mudar rápido. Além de me ver obrigada a encarar uma dieta, tive que vencer a inércia e começar a me exercitar.

Timidamente, assisti uma aula de treinamento funcional e, empolgada, resolvi me matricular em uma clínica. Meu primeiro dia de aula foi sui generis. Apresentada a minha nova turma, descobri que eu era a caçula ali. Meus colegas de ginástica formavam – em sua maioria -, um simpático grupo de idosos, sendo o mais velho o senhor que beirava 80 anos e era tratado pelo apelido de Zé.
Como radar de jornalista está sempre ligado, comecei a observar os alunos. Nesse exercício permanente de olhar o outro, vi que sobrava neles vitalidade e sonhos. Em meio ao circuito de exercícios que eu tive dificuldade para completar, meus companheiros de treinamento superavam suas limitações não só em busca de qualidade de vida, mas de novas metas. E, mesmo que seus corpos tivessem sido definidos pelas marcas de quem viveu mais, havia um poderoso brilho nos olhos de cada um, além de bom humor raro.

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Delicada, a professora que se autobatizou Habiba – nome árabe que significa pessoa amada – exibia com orgulho sua seleção de músicas preferidas. Além de clássicos dos anos 1950, 1960 e 1970, ela fez questão de salvar em seu celular versões mixadas de antigas canções, apresentando aos nobres senhores e senhoras o famoso batidão da modernidade, mas com conteúdo conhecido por quem já foi jovem um dia.

– Olha aí, Zé, você se lembra dessa?, perguntou a professora, sorrindo.

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– Nessa época, eu estava na dureza da roça tocando sanfona, respondeu o mais altivo do grupo, fã número um de forró.

Convidado por Habiba a experimentar, após as aulas, o pacote que prevê de hidratação a massagem relaxante, ele não quis saber da novidade.

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– Não quero, pois isso fere a minha masculinidade, respondeu Zé, dando uma gargalhada.

Homem de risada e histórias ótimas, Zé tornou-se um dos que me auxiliam a realizar os exercícios da aula. Ex-prefeito de um município do Norte mineiro, contador, advogado, filósofo, o meu amigo de 78 anos traz para os “treinos” a carga de conhecimento que nos faz pensar sobre o que os indivíduos acumulam durante a existência. Por isso, lamento profundamente a lógica do mercado de trabalho que despreza a força da experiência em troca de salários mais baixos pagos a quem tem frescor, formação teórica, mas que, na prática, ainda não iniciou a caminhada.

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Em uma sociedade na qual tudo é descartável, desde pessoas a coisas, estou cada vez mais convencida que colocar-se no lugar do outro pode ser um ótimo exercício de vida.

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