Ao longo das últimas semanas, formei com tantos outros colegas professores várias bancas incumbidas de avaliar os trabalhos de conclusão de curso de futuros jornalistas. E, pelo que consta, sempre houve um certo ritual: apresentar o aluno ou aluna, agradecer a presença dos professores, assistir à apresentação do estudante, comentar o trabalho, ouvir a réplica, pedir que o estudante se retire da sala e, por fim, emitir o veredicto, invariavelmente: “aprovado”.
A esta rotina, todavia, foi recentemente incluído um último ato: a foto feita com celular para ser distribuída em seguida, ou em momento mais oportuno, nas redes sociais. Por fim, já brincávamos que, sem a foto, o aluno não se formaria. Não adiantariam nossas assinaturas na ata da banca de avaliação nem tampouco o autógrafo do magnífico reitor no cobiçado canudo: aprovação, hoje, carece de likes.
Nada mais alinhado com o establishment que ora vigora. Não basta fazer, é preciso mostrar que fez. Ou está fazendo, assim, no gerúndio. Propaganda de si. Eu mesmo, humano ridículo limitado que só uso dez por cento da minha cabeça animal tenho lá no meu Facebook uma selfie supercurtida ao fim da minha banca de mestrado, de uns dois anos atrás. O meu equivalente pós-balzaquiano do “mãe, formei!”.
Mas isso não me impede de pensar no quão divertido e romântico deve estar sendo aquele jantar a dois, se o casal para a todo instante para tirar foto e postar no Instagram. No Facebook. Enviar pro grupo da família no WhatsApp.
Nossa, gente, deve estar emocionante mesmo.
Em alguns casos dá até pra acompanhar minuto a minuto, que nem jogo de futebol pelo Globoesporte.com: estamos aqui na risoteria, olha só esse vinho, noite perfeita com o meu <3, risoto top, de sobremesa essa mousse mara. Ainda bem que ainda não chegamos ao ponto de divulgar a diversão pós jantar romântico. Se é que tá tendo.
É assim nas estradas também. O que vi de gente fantasiada de ciclista parada no barranco da 040 tirando selfie domingo foi uma enormidade. Em vez de mergulhar profundamente na experiência daquele agora, o cidadão dá uma pausa no momento para compartilhar, porque não basta estar ali sozinho com a bike e o sol e o formigueiro e o asfalto. Ou com seu par romântico e o vinho e o risoto e o mousse mara. É preciso recortar e propagar a representação dessa experiência, mirando um prazer posterior. Aquele dos likes. Dos comments.
Assim me parece, saliente leitor, que em algum momento da história, o “curtir o momento” deu lugar a “que curtam meu momento”.
E se a propaganda, como diziam, é a alma do negócio, me questiono se não virá brevemente a ser a nossa alma também.