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A dignidade da árvore

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O gigante Rubem Braga via no álamo defronte a sua casa na Rua Roberto Del Rio, em Santiago do Chile, uma moça alta, muito alta, e branca, muito branca, de olhos verdes. Eu, cronista anão, tenho visto em toda árvore um brasileiro enraizado na sala de sua casa, na cozinha de seu apartamento, no cômodo único de seu barraco, enclausurado no cubículo dos dias. Poucos brasileiros podem, todavia, como um álamo, viver sem se mover.

Eis a grande dignidade de qualquer árvore: tirar seu sustento da terra, do sol e da chuva, sem arredar pé do sítio onde sua semente germinou.

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A nós, humanos, cabe a maldição do movimento. Andar pra lá e pra cá, como dínamos geradores de riqueza. Quantos são os brasileiros quem podem dar-se ao luxo do trabalho em casa? O sapateiro estará de home office? A manicure, o jornalista, a professora, o psicólogo, a cozinheira? Quantos deles podem ser profissionais-árvore, sustentar-se sem sair do lugar?

Penso nos demais que, nesses dias de paralisia, de árvore só têm a imobilidade. Então me vem à cabeça a imagem da grande árvore sem nome que erguia-se no quintal da vizinha, seca, desprovida de alegria, nem moça, nem olhos verdes, bruxa velha encurvada, dedos de garra, poltergeist nas noites de horror.

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Ora, não queremos ser isso, essa coisa fantasmagórica e triste, então nos movemos, porque é o que sabemos fazer, é o que fomos condicionados a fazer. Não pelo desejo de andar, mas pelo costume, por um instinto vital. Assumimos os riscos e nos movemos através do perigo do vírus, da doença e da morte, porque não temos em nós a dignidade da árvore. Não nos é permitida, pelo circo louco do consumo e das finanças e do crédito e da solidão e do desapreço por nós mesmos, a dignidade da árvore.

Então nos movemos.

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