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Teimosia

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Todo mundo que vive de escrever precisa de uma boa dose de teimosia. Eu não acho que alinhar palavras seja um ofício iluminado, um dom, uma maquininha que funciona na pilha da inspiração. É muito mais suor e insistência. Não largar as letras pra lá quando parece que não vai ter jeito de montar com elas uma fileirinha que faça sentido ou tenha importância. Tem que teimar.
Só quem tem o diabo de um prazo arfando no cangote sabe o desespero que dá um cursor piscando como se dissesse: “Escreve! Escreve! Escreve!”. E a cabeça nada de mandar combustível pros dedos digitarem. A gente fica feito um carro com a bateria arriada, esperando uma chupetinha redentora que faça as ideias darem partida.
Mas até o texto pegar no tranco, há que se insistir muito. Como agora. Nem sei porque fui cair nessa metáfora de carro, já que não dirijo, não tenho carteira e entendo bulhufas de qualquer veículo a motor. Mas escrever é um pouco assim. Quando você vê, aquele caminho que parecia rua sem saída era o próprio percurso. Os desvios que tinham toda cara de erro de motorista eram um atalho. O importante é chegar, a despeito de quem pense que o melhor é fazê-lo mais depressa ou – como se fosse possível – melhor.
Veja você, eu hoje sentei aqui cansada. De Brasil, de pandemia, de desgoverno e de um morro que precisei subir em jejum depois de me agulharem pra fazer exame de sangue – ufa! Devidamente alimentada, fui encarar o monitor, que já começou sua ladainha: “Escreve! Escreve! Escreve!”, com o demônio do prazo baforando quente aqui na nuca.
Sem querer falar de coisas que sempre falo, fui deixando os dedos correrem no teclado pra ver que bicho dava. Às vezes o melhor GPS é se deixar perder. E por teimar no descaminho, vim cair aqui neste ponto. Final. Teimosa.

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