Quando eu era criança, realmente era um tanto prodígio. Sempre pulei de uma atividade pra outra: balé, pintura, jazz, escultura, sapateado, teclado, handebol, e sabe a deusa o que mais. Meus pais nunca me obrigaram a fazer qualquer uma delas, o problema é que eu realmente me envolvia e queria continuar me dedicando a todas. Com o tempo, larguei o teclado porque era ansiosa demais para aprender partitura e só depois tocar as músicas de que gostava. A pintura e a escultura foram ficando um tanto mais sem graça ao passo que fui ficando mais velha e sabia que não seria a próxima Frida Kahlo ou Tarsila do Amaral. Do handebol, ficaram só as lembranças de muitas idas ao pronto-socorro com o joelho arrebentado, mas até lá pelos meus 18 anos, a dança ficou. (Não que eu achasse que seria bailarina, porque também sempre soube que não tinha talento e dedicação suficiente).
Ainda assim, quando olho para trás e me lembro da criança mega-atarefada que fui, estava invariavelmente feliz, e mesmo correndo, sempre encontrei tempo para brincar e era ótima aluna na escola. Nunca fui cobrada para ser a melhor em qualquer coisa que fizesse, mas sempre gostei da sensação de fazer as coisas bem, o que involuntariamente fez com que eu me tornasse extremamente autocrítica. Durante muitos anos da vida, isto não foi um problema, tirando pelas notas baixas em geometria analítica, recebidas com muitas lágrimas e revertidas com muitas aulas particulares.
Mas não existe tutoria para as falhas da vida adulta. Fatalmente, decepcionaremos a nós mesmos e às pessoas que mais amamos, simplesmente porque a vida não tem uma grade curricular previsível e nós, depois que crescemos, perdemos o talento para sermos podígios. Se o que desenhamos como nosso cotidiano sai feio ou meio torto, mesmo que alguém dê um sorriso amarelo e nos diga que “está lindo”, nos tornamos céticos demais para acreditar. Sabemos que falhamos, e pior: que falharemos de novo, por mais que tentemos acertar. Ninguém é correto ou belo o tempo todo. Somos falíveis e falhos. E sim, falhar dói. Mas passa – ainda que, vez ou outra, deixe cicatrizes.
Sou completamente contra a nostalgia de querer voltar em algum tempo da vida. Meu tempo é agora. Mas se por algum lapso eu pudesse chegar ao pé do ouvido da Julinha multiatarefada, menina prodígio, eu diria para ela errar sempre que pudesse. Só para ir se acostumando.