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Ordem de pagamento

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Há muitos anos eu vivo patologicamente descolada do presente, com diagnóstico médico e tudo. Ancorar meus pés no hoje é sempre um esforço hercúleo, já que eles tendem a querer caminhar para um passado conhecido ou a dar alguns passos à frente, preocupados em excesso com a estrada que vem à frente – que será que ela traz? Com o tempo, fui aprendendo que pausas e respirações ajudam no teletransporte para o agora.

A viagem, contudo, não sai de graça. Com a economia como está, no pedágio para o presente paga-se a salgada tarifa do desencanto. Meu saldo devedor está nas alturas. Pensei nestes dias que talvez nunca mais fique no azul. Estou quebrada, falida.

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Ainda assim estou no lucro, garantido pela minha conta com muitos privilégios premium desde o nascimento. Minha titularidade nunca esteve ameaçada por bala perdida com endereço, pelo “risco” de ser quem sou, ou por portas fechadas pelo mesmo motivo. Dito isso, não escapo da possibilidade de ser questionada, diminuída, objetificada, silenciada e até ameaçada, mulher que sou. “O que mais você quer, filha, para calar a boca?” Não tem dinheiro que pague, adianto.

Feita minha contabilidade, reconheço que vez em quando terceirizo umas dívidas com quem divide a caminhada comigo. Embora não tenha religião, respeito a sabedoria popular, e porque não ando só, não hei de morrer pagã. 

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Endividada por vir pagando altíssimas taxas de desalento, recebi por transferência eletrônica esses dias um cheque de altíssimo valor. “Faz uma crônica pra mim sobre como ter um ótimo astral que você tem.” Embora discorde sobre a linha de crédito do meu astral, meu segredo de economia pessoal é esse: tenho investidores e investidoras infalíveis, que nunca deixam a cotação do afeto cair mesmo em tempos infindáveis de recessão. Agradeço timidamente com esta ordem de pagamento coletiva, aos cuidados do amigo Olavo Prazeres.

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