Quando o carnaval de rua começou a ganhar força novamente por essas bandas, Juliana descobriu que amava. Com o tempo, tinha até “garrado” intimidade, e não ia mais para blocos, mas para “bloquinhos”: “Onde tem ‘bloquinho’ hoje?” E se paramentava: gatinha, diabinha, anjinha, fada, fantasia de grupo cazamiga, e sempre, invariavelmente, uma dose ineliminável de glitter, que permanecia no corpo por semanas a fio. O melhor da festa na rua? “É festa para o povo, todo mundo se diverte, isso que é democracia!”, repetia Juliana por todo canto. Além disso, parecia que tinha estourado um cano de gente bonita e cheia de “goodvibes”. “Que é cara do carnaval, né gente?”, pregava a foliã.
Assim como ela, mais e mais pessoas foram descobrindo as maravilhas da folia na rua. No último ano, entretanto, Juliana ficou possessa quando chegou à concentração do “bloquinho”. Já estava lotado. Tava difícil achar “gente bonita”, com o tanto de “gente estranha” e/ou “mal-encarada” que começou a querer entrar na festa de “gente de bem”. “Um povo meio ‘nada a ver’, que andava só em bando, ocupando a festa que era nossa”, lamentava-se Juliana, que nunca havia movido uma palha para a organização do “bloquinho”, mas ainda assim sentia-se detentora de posse sobre o bendito. “Só abrir pro povão que dá confusão”, dizia ela, sentindo saudades do tempo em que não havia brigas no “bloquinho”, ou, mentira, havia sim, mas entre seus amigos e conhecidos, era de “rolo de mulher” ou “briga de gente chapada”, então não importava se eles rolavam no chão de porrada: “é tudo de casa, uma hora alguém aparta.”
Indignada, Juliana fez o diabo. Entregou ofício pros organizadores do bloco, que disseram que a festa havia crescido muito, fora do controle deles, e eles não tinham muito o que fazer a respeito. Disseram até que entendiam quem tinha deixado de ir à folia, por conta das proporções que ela havia tomado. “Mas não dá pra voltar a ser como antes, só nosso?”, indagou a foliã. “Mas você é da organização?”, perguntou honestamente alguém, que de fato era. Sem reposta, Juliana saiu pisando quente. Mas não ia deixar barato. Foi à Prefeitura, foi à imprensa, foi à polícia, fez um escândalo para “salvar” o bloquinho. Tanto fez que as autoridades prometeram que no ano seguinte seria diferente. Ela respirou aliviada, e esperou ansiosa.
Passa-se um ano, chega o dia do “bloquinho”. Munida de purpurina e adereços, Juliana se dirige ao local da festa depois do clássico “esquenta” cazamiga e os boy. Chegando à “concentra ” do bloco, fica perplexa ao ser barrada por um PM. Agora o “bloquinho” tinha entrada e catraca: “Já atingiu o limite de público, moça. Pessoal chegou cedo para garantir”. E não teve “molhada de mão” ou charminho que a fizesse entrar. Revoltada, Juliana saiu, mas não sem gritar a plenos pulmões: “O que vocês estão fazendo é um absurdo! Carnaval é festa do povo!”