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Não comprei outro maço

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Não há sentido em qualquer título sem uma festa profana nas rampas do Maracanã (Foto: Alexandre Vidal/Flamengo)

Três cigarros seriam insuficientes para dois tempos de 45 minutos. Por óbvio, seriam. Os três queimariam apenas nos sete minutos de acréscimos que deu Rodolpho Toski Marques no Morumbi na última quinta-feira (25). O maço acabava e há um compromisso cínico de que o atual é sempre o último. Mas não dá para assistir a um jogo decisivo com apenas três cigarros. É que não havia, ali, na iminência do julgamento de mérito do campeão brasileiro, arrebatamento algum. Então, não comprei outro maço.

Qualquer rubro-negro calejado sabia aos 30 minutos da segunda etapa que o Flamengo dependeria exclusivamente do que se passava àquela altura em Porto Alegre. Porque a alegoria rubro-negra tem tantas dificuldades em vencer no Morumbi como os alemães tinham em invadir a União Soviética. Embora tenha dado ao Internacional o ônus de um confronto direto fora dos próprios domínios, a história, faceira, reservou aos colorados a quebra de um jejum de 41 anos no Gigante da Beira-Rio diante de um rival combalido.

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Edenilson me levou ao chão da sala e, desde que me ergui, tento idealizar como me lembrarei deste título daqui a 40 anos. O que contarei aos meus filhos, talvez sobrinhos, a mim mesmo. Se não restar algum ressentimento, direi, como um canalha, que, até mesmo ao ser derrotado, o Flamengo era campeão. No entanto, como a tristeza é senhora, certamente me lembrarei como o primeiro título sem Jorginho no vestiário. Aquele da pandemia. Por sorte, se tiver memória boa, ainda acrescentarei depois de três segundos reticentes: “O campeonato coincidentemente acabou quando o Brasil registrou a marca de 250 mil mortos.”

Não há sentido em qualquer conquista rubro-negra sem arroubos megalomaníacos. Sem que a torcida tenha ido ao Maracanã uma vez sequer ofender acintosamente Rogério Ceni ou jogar a bituca no pavio de Gabriel. Somos Flamengo porque a única certeza indubitável é o reencontro na apoteose, a miragem descomedida, a comunhão desenfreada. E a pandemia ceifou até aquilo que nos restava. Talvez o erro seja esperar o típico de um momento atípico, mas não há sentido em qualquer título sem uma festa profana nas rampas do Maracanã.

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